Quinta-feira, 6 de Agosto de 2009
O futuro em Angola
Sinestesia, assim se diz da produção de duas ou mais sensações sob a influência de uma só impressão. Assim foi em Luanda, centro político de inusitado crescimento económico e preocupantes tensões financeiras. Com uma média de crescimento anual de 17,5% nos últimos três anos, Angola é, ainda assim, a expressão viva de um país que está por fazer.
UMA SÓ IMPRESSÃO: Devastação. Terra batida, carros e carros e mais carros, vendedores de rua, sofás dispersos ao longo das estradas, detritos, esgotos, pessoas, tudo numa aparentemente harmoniosa e lenta convivência, não fosse o verde das fardas e as armas que não reconheço. Assim é até Luanda Sul. Lá, os condomínios fechados, construções razoáveis a preços proibitivos, impossíveis para a imensa maioria, pobre e excluída. Depois, há a baía, a despertar o sentido da descoberta de tudo o mais, que não vi.
AS SENSAÇÕES: Os dividendos da paz são letra morta em Luanda. Há outros dividendos, do petróleo, dos dólares, da(s) guerra(s). Multiplica-se e confunde-se o comércio formal, informal, paralelo, subterrâneo ou, como um empresário opta por lhes chamar, as informalidades, os custos de contexto. Negligências. Mais eufemismos para um 81º lugar no ranking geral de negócios (em 82 países), um risco de crédito 6 (em 7), preocupantes tensões financeiras do tipo FMI e um 162º lugar no Índice de Desenvolvimento Humano. Em Angola nasce-se e espera-se viver 41,7 anos. Poucos anos para tantos recursos naturais. É manifesta a discricionariedade desta economia do petróleo, que explica 60% do PIB, 95% da exportações e um Gini elevadíssimo embora de valor desconhecido. Recordam em voz alta uma estória de Oliveira Salazar, quando já rebentada a guerra colonial: "Senhor Presidente do Conselho! Há petróleo em Angola!", "...só me faltava mais essa." Incerto futuro, mas muita História. Triste História. E a língua que nos aproxima.
OS NÚMEROS AO CONTRARIO: Angola é já o quarto mercado cliente de Portugal e o primeiro extra-comunitário. Em 2008, o nível das nossas exportações para este mercado ultrapassou os 2,2 mil milhões de euros. Entre Janeiro e Maio de 2009 o seu crescimento homólogo foi de 20,1%, provando o êxito do encontro entre a oferta e procura portuguesa e angolana, mesmo em contexto de crise generalizada. Angola é também um nosso importante mercado fornecedor, ocupando um mais modesto 23º lugar, mas com uma assinalável subida de 100 posições nos últimos quatro anos. É também o quinto maior destino de investimento português.
O REFORÇO DO FUTURO: A economia portuguesa precisa de crescer também alavancada pelo eixo das novas geografias. Neste prisma, o nível de trocas comerciais com Angola é apenas uma incipiente plataforma para o reforço da nossa internacionalização. As afinidades culturais e linguísticas podem escorar uma pequena mas significativa e bem aceite presença económica portuguesa. Em reciprocidade de posições financeiras. Sobre os nossos negócios em Angola, dizem-me: é preciso um parceiro, tempo, dinheiro. Tempo. Muito tempo. Concordo. Não deve o inusitado crescimento fazer-se cúmplice de um desenvolvimento ausente. Não deve haver almoços quase-grátis. Em lugar nenhum.
Há viagens que marcam pelos modos diferentes, a procura da oportunidade, a concretização negocial, ou simplesmente a vivência de algum imaginário religioso ou afectivo que faça parte da nossa memória colectiva. Não foi assim em Luanda. Não é fácil compreendê-la. É necessário arquivar transitória e mentalmente as tantas páginas de economia da defesa, de teorias de obstáculos e da dependência, também as da doença holandesa. É preciso começar por outro princípio. Pepetela. Talvez Maiombe ou Yaka. Reler a Geração da Utopia.
Nota: As estatísticas apresentadas estão disponíveis em GEE, Ficha de Mercado Angola - AICEP, Relatório Desenvolvimento Humano 2007/08
UMA SÓ IMPRESSÃO: Devastação. Terra batida, carros e carros e mais carros, vendedores de rua, sofás dispersos ao longo das estradas, detritos, esgotos, pessoas, tudo numa aparentemente harmoniosa e lenta convivência, não fosse o verde das fardas e as armas que não reconheço. Assim é até Luanda Sul. Lá, os condomínios fechados, construções razoáveis a preços proibitivos, impossíveis para a imensa maioria, pobre e excluída. Depois, há a baía, a despertar o sentido da descoberta de tudo o mais, que não vi.
AS SENSAÇÕES: Os dividendos da paz são letra morta em Luanda. Há outros dividendos, do petróleo, dos dólares, da(s) guerra(s). Multiplica-se e confunde-se o comércio formal, informal, paralelo, subterrâneo ou, como um empresário opta por lhes chamar, as informalidades, os custos de contexto. Negligências. Mais eufemismos para um 81º lugar no ranking geral de negócios (em 82 países), um risco de crédito 6 (em 7), preocupantes tensões financeiras do tipo FMI e um 162º lugar no Índice de Desenvolvimento Humano. Em Angola nasce-se e espera-se viver 41,7 anos. Poucos anos para tantos recursos naturais. É manifesta a discricionariedade desta economia do petróleo, que explica 60% do PIB, 95% da exportações e um Gini elevadíssimo embora de valor desconhecido. Recordam em voz alta uma estória de Oliveira Salazar, quando já rebentada a guerra colonial: "Senhor Presidente do Conselho! Há petróleo em Angola!", "...só me faltava mais essa." Incerto futuro, mas muita História. Triste História. E a língua que nos aproxima.
OS NÚMEROS AO CONTRARIO: Angola é já o quarto mercado cliente de Portugal e o primeiro extra-comunitário. Em 2008, o nível das nossas exportações para este mercado ultrapassou os 2,2 mil milhões de euros. Entre Janeiro e Maio de 2009 o seu crescimento homólogo foi de 20,1%, provando o êxito do encontro entre a oferta e procura portuguesa e angolana, mesmo em contexto de crise generalizada. Angola é também um nosso importante mercado fornecedor, ocupando um mais modesto 23º lugar, mas com uma assinalável subida de 100 posições nos últimos quatro anos. É também o quinto maior destino de investimento português.
O REFORÇO DO FUTURO: A economia portuguesa precisa de crescer também alavancada pelo eixo das novas geografias. Neste prisma, o nível de trocas comerciais com Angola é apenas uma incipiente plataforma para o reforço da nossa internacionalização. As afinidades culturais e linguísticas podem escorar uma pequena mas significativa e bem aceite presença económica portuguesa. Em reciprocidade de posições financeiras. Sobre os nossos negócios em Angola, dizem-me: é preciso um parceiro, tempo, dinheiro. Tempo. Muito tempo. Concordo. Não deve o inusitado crescimento fazer-se cúmplice de um desenvolvimento ausente. Não deve haver almoços quase-grátis. Em lugar nenhum.
Há viagens que marcam pelos modos diferentes, a procura da oportunidade, a concretização negocial, ou simplesmente a vivência de algum imaginário religioso ou afectivo que faça parte da nossa memória colectiva. Não foi assim em Luanda. Não é fácil compreendê-la. É necessário arquivar transitória e mentalmente as tantas páginas de economia da defesa, de teorias de obstáculos e da dependência, também as da doença holandesa. É preciso começar por outro princípio. Pepetela. Talvez Maiombe ou Yaka. Reler a Geração da Utopia.
Nota: As estatísticas apresentadas estão disponíveis em GEE, Ficha de Mercado Angola - AICEP, Relatório Desenvolvimento Humano 2007/08
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