quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Batuque no feminino



Elas vêm do Celamar e estão há quatro anos no mercado. Casaram as artes plásticas com o som do batuque, lá no quintal da tia Marcela, na Ilha de Luanda. Têm tudo ao seu dispor tudo para oferecer a quem as visita uma tarde musical quente. As primeiras batucadas eram imperceptíveis, mas quando acertaram e se deixaram embalar, o resultado foi o som alegre, acompanhado do bailar das ondas, que faziam parar quem passasse, para descobrir de onde vinham e quem produzia tão contagiante som. Para espanto de muita gente, o som do batuque vinha de mãos femininas, num grupo composto por 12 meninas, dos 17 aos 27 anos de idade. Margarida Nkai, Luísa Monteiro, Madalena Damásio, Isabel Tondela, Mimosa Meneses, Antónia Graça e Jerusa Candengue, são algumas das muitas meninas que fazem parte do agrupamento que já participou em eventos nacionais e internacionais. Com o batuque traduzem a linguagem das ruas, dos homens sem trabalho, dos males, da gente que quase passa fome, que reflecte com melancolia o futuro, como descreve ao Jornal de Angola a sua coordenadora, Marcela Costa, acrescentando que é uma música que veio para incomodar, revelar uma realidade de dureza que passa grande parte da população angolana e ao mesmo tempo valorizar as nossas tradições. Margarida Nkai é a mais antiga no grupo. Aceitou o desafio, mesmo sabendo que podia ser alvo de comentários desagradáveis. “Foi uma proposta feita pela Marcela Costa. Achei interessante. De princípio fiquei envergonhada e indecisa, porque é um instrumento mais tocado por homens. Mas resolvi apostar”. Nkai, que também é amante da pintura, disse que casou o seu amor pelas artes plásticas com o som do tambor. “Deu-me um par perfeito e bem tradicional, porque o som do batuque alivia a alma e obriga-nos a mergulhar na nossa subconsciência” - disse. O som do batuque, segundo Margarida Nkai, transmite nos seus ritmos o mesmo segredo que o jogo de cores de um quadro bem pintado. “Tudo acelerado, nervoso, embala várias mensagens”, sublinhou. Isso, disse, é o mais importante na proposta do grupo.

Resgate dos valores

Jerusa Candengue, integrante do grupo, sonha ir mais longe. “Eu sei que são poucas a mulheres que se interessam por este estilo de música, mas ela, para os nossos antepassados, transmitia mensagens especiais”, disse, acrescentando que com o som do batuque pretendem, também, divulgar a expressão popular, partindo dos seus lugares de origem, como os musseques, povoados, subúrbios, feiras e mercados, possibilitando a integração entre o povo e as suas tradições. Marcela Costa, a coordenadora do grupo, informou que este é o único grupo feminino no país, mas, que urge a necessidade de as pessoas, particularmente as mulheres, interessarem-se por este tipo de arte. “Precisávamos apostar e mostrar à sociedade que as mulheres também podem usar este instrumento que, por sinal, é muito comum em África. Não vamos pensar que ela é somente uma actividade masculina”. Apesar dos adjectivos aplicados a estas meninas, Marcela Costa disse que o grupo aceitou o desafio e hoje cada uma a seu jeito procura resgatar os valores musicais africanos, através da história que lhes foi contada, sobre a origem e o significado do batuque. “Este é o momento de fazermos sentir que chegou a fase de resgatarmos os nossos valores e as mulheres devem ser as primeiras a valorizar a nossa identidade. Devemos contribuir para o seu desenvolvimento e não mergulhar naquilo que não é nosso”, disse Marcela Costa. Fonte: JAngola

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