Já se vão vendo resultados positivos no projecto de recuperação da palanca negra gigante.
Deliciem-se!
Caros amigos,
O terceiro trimestre é usualmente o mais atarefado na Cangandala/ Luando e este não foi excepção. Começámos por fazer uma série de melhoramentos na vedação do santuário, da qual a mais importante foi a modificação significativa do perímetro, acrescentando 800 hectares do melhor habitat à superfície do santuário. O recinto vedado cobre agora cerca de 4.000 hectares, o que julgamos ser suficiente pelo menos para os próximos 5 anos. Também o novo ?design? é agora mais arredondado e mais manejável, e pudemos ainda incluir uma das melhores salinas que antes ficava fora do santuário e algumas boas zonas de pasto. Também aproveitámos a oportunidade para construir três bebedouros, dois dentro e um fora do recinto. Junto do bebedouro central, foi colocado um tanque de água elevado, para alimentar os bebedouros por gravidade. Antes do final do ano, esperamos fazer um furo artesiano para abastecer permanentemente o tanque elevado.
Em Julho esperávamos ter tido o helicóptero e equipa de capturas para imobilizar algumas das fêmeas velhas que não estão a reproduzir e fazer-lhes um tratamento hormonal, e também para fazer um survey e exercício de marcação de palancas no Luando. Infelizmente, e por causa de alguns constrangimentos burocráticos de última hora no Botswana, o helicóptero não pôde vir e a operação teve de ser cancelada. Em qualquer dos casos tivemos Pete Morkel connosco, e uma equipa de veterinários da faculdade do Huambo, pelo que usámos a oportunidade para acompanhar de perto as manadas, e tentar imobilizar alguma das velhas fêmeas. Acabámos por não conseguir aproximar-nos o suficiente das fêmeas para as poder imobilizar, e como consolação capturámos e marcámos o jovem macho de palanca castanha que está dentro do santuário.
Se isto foi um pouco decepcionante, pelo menos tudo o resto revelou-se melhor que as expectativas. As primeiras boas notícias foi encontrar o Duarte ainda vivo. Não há dúvida que ele levou um grande tombo, mas pelo menos sobreviveu. Em resultado da luta com o Ivan, ele perdeu um dos brincos e apresenta agora algumas cicatrizes e feridas de cornadas. Muito embora encontrar o Duarte tenha sido fantástico, temos agora de encarar o facto de que ele está derrotado e a sua carreira como macho reprodutor chegou ao fim. Está já a coxear notoriamente das patas traseiras, perdeu condição física, a sua pelagem está seca e perdeu o brilho de outrora, e as carraças estão a tomar conta dele. Permitiu-nos chegar bem próximo, mas já não consegue acompanhar a passada e ritmo da manada. Em Setembro o seu estado não tinha melhorado, e suspeito que ele já não viva para além da época da chuva. Uma observação bastante interessante foi verificar que ele agora alimentava-se sobretudo de folhas queimadas de ?kinzole? (Diplorhynchus condylocarpon) ? já temos visto animais saudáveis alimentarem-se de folhas frescas de kinzole, mas não das folhas queimadas. Isto poderá ser o resultado dos seus dentes a ficarem gastos e levando-o a procurar alimento menos fibroso (mas também menos nutritivo), mas isto é especulativo claro.
Mas se o Duarte parece estar acabado, mesmo assim o cenário em termos de machos parece estar sob controlo. Não apenas o Ivan está novamente fora do santuário e a comportar-se bem por agora (patrulhando regularmente as salinas no seu território), mas o que é mais importante, o Mercúrio assumiu sem sombra de dúvida o lugar do Duarte como macho reprodutor. Apesar da sua tenra idade (2 anos), ele tem já uma aparência de respeito, e é claramente ?o homem da casa?. Vimo-lo várias vezes a cortejar as fêmeas e tentando montá-las, até na presença do Duarte, que ignorou a cena e simplesmente se afastou.
Mas uma constatação muito mais importante, foi verificar que os nossos receios de que o Ivan pudesse ter raptado algumas fêmeas, se revelaram completamente infundados! Pudemos observar e confirmar dentro do santuário, as 6 jovens fêmeas trazidas do Luando em 2011, e as restantes 6 velhas fêmeas da Cangandala (das 9 iniciais, duas morreram já de velhas e uma, Joana, escapou do santuário em 2009). Assim basicamente, o santuário mantém todo o potencial reprodutivo intacto. E fora do recinto, apenas o Ivan e a Joana estão estabelecidos.
A câmara oculta montada junto da carcaça da velha fêmea, Neusa, que tinha morrido no incício de Junho, produziu algumas sequências interessantes. Como suspeitávamos, e na ausência de grandes predadores, os potamocheros (javalis africanos) são os principais necrófagos oportunistas, e durante várias semanas uma grande família de porcos visitou o local quase todas as noites, até que pouco restava.
As novas câmaras têm vindo a tirar dezenas de milhar de fotos, com muito poucos falos eventos, tornando o trabalho de catalogar uma árdua tarefa e armazenar as fotografias um verdadeiro pesadelo. As espécies habituais foram fotografadas muitas vezes, e mais alguns clientes inesperados, como manguços, lebres ou calaus.
Por outro lado, em Julho e Agosto tivemos alguns problemas, que incluiram várias queimadas suspeitas, uma câmara manuseada por intrusos e ainda uma câmara roubada. Foi esta a primeira câmara roubada desde que as começámos a utilizar em 2004. Temos boas razões para acreditar ter sido o serviço de caçadores furtivos na origem de todos estes incidentes, mas este é um assunto que está sob investigação.
Com o helicóptero de capturas retido no Botswana, organizámos um par de voos sobre o Luando e Cangandala num Allouette militar. A Força Aérea Nacional tem sido sempre um apoiante entusiástico à altura do desafio, e deveria ser um exemplo para todos. E afinal de contas, a palanca negra gigante é um símbolo nacional e bem merecedora de um compromisso incondicional! Pudemos então localizar duas das manadas do Luando, e fazer um reconhecimento, concentrando-nos nas áreas mais sensíveis e focos identificados de caçadores furtivos, tais como em variadas pequenas lagoas. A caça furtiva ainda é de longe a maior ameaça no Luando, e longe de estar controlada. O que pudemos atestar nesta altura foi que a maior manada parece estar a evoluir bem, e com cerca de 75% de taxa de recrutamento de crias de 2011 para 2012. Ou por outras palavras, podemos ter tido cerca de 25% de mortalidade de crias no ano passado, o que é um resultado aceitável, e dentro das taxas ?normais? e expectáveis.
Mesmo assim, a situação é extremamente delicada, e bastarão um par de incidentes com caçadores furtivos, e todo o esforço irá pelo ralo.
De volta à Cangandala em Setembro, tivemos mais boas notícias. Primeiro deparando-nos com mais um nascimento! A mãe era uma das jovens fêmeas, e o pai provavelmente terá sido o Duarte, mas isso ainda requer confirmação.
E então surpreendentemente ou talvez não, a Teresa mais uma vez, está com sinais claros de gravidez avançada. Mas que parideira maravilhosa! Vai produzir a quarta cria em pouco mais de 3 anos, no que é uma perfomance reprodutora notável. Será agora interessante determinar quem será o pai desta cria, já que poderá ter sido qualquer um dos três machos presentes.
Fotos poderão ser vistas neste link:
Pensar e Falar Angola
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