FALHAMOS TODOS NA APLICAÇÃO DOS ACORDOS DE ALVOR
Almerido Jaka Jaca, é um dos históricos da UNITA, partido onde já ocupou várias posições de destaque. É formado em Filosofia, pela Universidade Clássica de Lisboa e foi por muito tempo professor das cadeiras de Filosofia e História no Liceu de Oeiras em Portugal.
Ingressou na UNITA em 1972 e dois anos depois, participou na preparação dos acordos de Alvor pelo seu movimento. Por forças desses acordos ocupou pela UNITA a pasta de secretário de Estado da informação no governo de transição. A nível partidário já exerceu funções de secretário de educação, informação, dos Negócios Estrangeiros e da Cultura e Herança Africana.
Actualmente, com 50 anos de idade Jaka Jamba representa o galo negro no parlamento angolano.
P- 25 anos depois da assinatura do acordo de Alvor ,que avaliação se pode fazer?
JJ - 25 anos depois podemos dizer que se por um lado a independência formal é caso adquirido,por outro há um longo percurso que deverá ser ainda cumprido para que a independênciacorresponda as aspirações mais profundas de todos aqueles que de uma forma ou de outra, lutarampara esse momento.
P - O que é que falta fazer?
JJ - No caso concreto de Angola há ainda algumas premissas básicas que ainda não foram adquiridas. Uma dessas premissas é a criação de um contexto favorável para o aparecimento de instituições supra apartidárias que tenham como objecto social a defesa e a preservação dos valores mais altos dasociedade angolana.
P – Os acordos de Alvor não previam esse contexto?
JJ - As negociações que culminaram com os acordos de Alvor visam mais a marcação de uma data paraa independência de Angola, o fim da presença colonial portuguesa em Angola e isto foi um factoadquirido a 11 de Novembro de 1975, mas a construção de um novo estado que permitisse um plenodesenvolvimento de todos partidos políticos é ainda uma tarefa por se fazer.
P – Nas negociações não foi discutida Angola pós independência?
JJ - Nem todo o pacote da independência e do período pós independência poderia ser podia ser discutidona mesma altura, mas, haviam aspectos que envolveram a potência colonizadora e outros países dacomunidade internacional, de qualquer a construção de uma nova nação era uma tarefa dosangolanos os partidos políticos é que deveriam assumir essa responsabilidade. É verdade que houve um quadro concreto que foi o governo de transição multipartidário e rotativo. Esse governo tinha a responsabilidade de conduzir o país até a independência e depois tínhamos que encontrar formulas de conduzir o país.
P – Dentro deste quadro que está descrever , Portugal parece não ter tido nenhuma culpa no que sucedeu depois?
JJ – Houve no nosso caso concreto responsabilidades a vários os níveis. Portugal tinha as suas responsabilidades como potência colonizadora que era a agilização do processo de transição. A instabilidade política que se vivia em Portugal, resultante dos acontecimentos de 25 de Abril, teve muita influência em Angola, por outro lado, o contexto internacional em que se desenvolveu a luta pela independência de Angola pensou bastante. Foi um quadro da guerra fria em que as duas super potências tentavam tirar partido das suas influências, esta é a conjuntura que se desenvolveu o que fez com que houvesse uma grande luta de interesses em Angola no plano externo. Depois tem um outro elemento que é pouco referenciado nos debates: A responsabilidade e a capacidade dos próprios angolanos na construção de um estado novo e esta falta de concepção de bases mais sólidas degenerou no conflito que ainda hoje tem destruído o país.
P – Para além da fixação da data de independência o que é que os acordos de Alvor previam mais?
JJ - Também previam eleições, mas o grande problema que se levantou naquela altura, é que as escolas das elites políticas de então não concebiam um quadro de pluralismo de ideias . onde o vencedor podesse coabitar com outras partidos perdedores nas eleições esta para mim foi a principal fraqueza. Porque nós os angolanos poderíamos ser os pioneiros da democracia em África por sermos um dos um dos poucos, senão o único país africano que ao firmar a independência com a potência colonizadora reconheceu três movimentos de libertação representativos.
P.- Quem inviabilizou a realizações de eleições que estavam previstas nos acordos de Alvor?
JJ – No dia 1 de Janeiro de 1975 tinha sido formado o governo de transição composto pelos portugueses e pelos três movimentos, o MPLA,FNLA e a UNITA mas, a medida em que o calendário aproximava ao 11 de Novembro, gerou-se aqui em Luanda, um clima de instabilidade militar marcado por ataques as delegações e campanhas de diabolização entre os movimentos, o que impediu uma coabitação sã. Em Agosto do mesmo ano nós, a UNITA, tivemos que sair de Luanda porque a situação era insustentável e depois seguiu-se a FNLA em suma, não estavam criadas as condições para uma tolerância política que permitisse a realizações de eleições. O que se seguiu depois foi uma corrida contra o tempo de cada movimento afim de chegar ao 11 de Novembro como poder.
P – Esta situação teve uma mão de Portugal?
JJ – Os vários intervenientes no processo, incluindo o próprio Portugal tentaram ajudar o movimento que estivesse mais próximos dos seus interesses.
P – A UNITA sentiu também esse apoio?
JJ – Houve personalidades do governo português que tiveram muita influência, embora alguns mais tarde tivessem que sair. Por exemplo o Almirante Rosa Coutinho apoiava abertamente e claramente o MPLA.
P – A UNITA não teve apoio de alguém do governo Português de então?
JJ – Tudo quanto julgo saber não. Nós não tivemos nenhum apoio de personalidades do governo português, porque naquela altura a maior disputa centralizava- se a volta do MPLA e da FNLA. A acção da UNITA era a nível interno.
P – Vocês conheceram alguma acção de Portugal naquela altura e que podesse por causa a realização de eleições?
JJ – Talvez não seja muito oportuno citar-se nomes, mas houve manobras nos bastidores, sobretudo daqueles que tinham apostado no MPLA, no sentido de conduzir esse movimento ao poder. Houve ate missões como a Otelo de Carvalho um político e militar bastante influente em Portugal, que contactou Fidel de Castro afim de enviar tropas cubanas à Angola para salvarem o seu aliado, o MPLA. E isto está escrito nos arquivos e para aqueles que acompanhar o filme “África Vermelha” ouviram um depoimento do próprio general Otelo de Carvalho.
P – Em algum momento a UNITA sentiu-se marginalizada durante a discussão do acordo de Alvor?
JJ – Absolutamente, aliás a partir mesmo do momento em que se deu o golpe de estado em Portugal e com a eminência do fim do colonialismo em Angola, começaram a surgir a vários níveis manobras que visavam diabolizar uns e marginalizar outros e em Angola sentiu-se muito isso.
P- Quem falhou na aplicação dos acordos de Alvor?
JJ – Falhamos todos, os colonizadores porque não conseguiram assumir plenamente o seu papel e o seu compromisso diante da comunidade nacional e internacional e sobretudo porque não conseguiram conceber uma filosofia que permitisse a criação de um estado angolano com pluralismo de ideias .
( publicada no Diário de Notícia 25.04.1999)
Pensar e Falar Angola
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