terça-feira, 4 de novembro de 2008

Vida Reconstruida



- O angolano António Ribeiro é um homem que se encaixa em vários papéis. A sua altura revela o passado como jogador de basquete semi-profissional. Sua eloquência e desenvoltura mostram sua natureza política e conciliadora. A constante disposição exibe uma vontade real de trabalhar. Mas não precisa ir muito longe para descobrir a verdadeira essência de Ribeiro: um jovem activista de HIV/SIDA, que viu no diagnóstico positivo não uma sentença de morte, mas uma chance de dar uma guinada de 180 graus em sua vida. “No começo pensei que a doença era um desastre na minha vida, mas foi ela que me mostrou potenciais que eu nem sabia que tinha”, conta. Cinco anos depois de seu diagnóstico, Ribeiro quase não se reconhece. Casado, pais de dois filhos e co-fundador da Rede Nacional de Pessoas Vivendo com HIV/SIDA, ele diz que quase não achava que um dia reconstruiria sua vida desse jeito.



Meu nome é António Ribeiro e tenho 30 anos. Fui diagnosticado em 2002. Na época estava fraco, pálido, tinha doenças oportunistas e infecções transmissíveis sexualmente, inclusive sífilis. Um médico me recomendou fazer o teste. Acho que fui infectado por sexo desprotegido, mas nunca tinha me ocorrido fazer o teste antes. Fui fazer o teste e tive um péssimo aconselhamento. O médico simplesmente me entregou o resultado e disse: “Deu positivo. Você sabe quantas pessoas já infectou?” Saí de lá como um condenado. Fiquei quinze dias sem comer, sem dormir, a reflectir o que seria de mim. Não dormia porque achava que ia morrer no dia seguinte, mas não morria. Aí não dormia na noite seguinte. Já me considerava meio morto. Por causa desses dias, meu estado piorou muito. Comecei a fazer o tratamento em 28 de Agosto de 2002. Foi uma vitória, em grande parte graças ao meu médico, o dr. Alberto Stella [coordenador nacional do ONUSIDA em Angola] porque na época não havia ARVs em Angola. Aderi fielmente ao tratamento, que faço até hoje. Desde o diagnóstico só tive uma recaída, em 2005. Um dia acordei e não conseguia andar: era uma co-infecção de HIV e tuberculose óssea. Fiquei engessado entre o pescoço e a cintura por quatro meses. Voltei a andar, mas foram dias péssimos. Quando fui diagnosticado, só contei para um amigo e meus irmãos. Eu sabia o que era discriminação porque meu pai viveu com lepra por 50 anos. Minha mãe nos abandonou e nós ficamos cuidando dele. Ele não saía de casa por causa da doença. Meu trabalho como activista começou no mesmo ano em que fui diagnosticado. Fui levado à ONG Luta pela Vihda e lá conheci outras pessoas na mesma situação. Era um grupo onde as pessoas dividiam os problemas e as outras se uniam para ajudar. Essa união foi uma das razões por que resolvi ser activista. Hoje sou um dos directores da Luta pela Vihda, e em 2007 ajudei a fundar a Rede Nacional de Pessoas Vivendo com HIV/SIDA, da qual hoje sou coordenador nacional. Queremos ter na Rede a mesma união e solidariedade que recebi quando soube da minha condição. Nunca achei que fosse reconstruir minha vida desse jeito. Estou casado há três anos – conheci minha mulher numa reunião para pessoas infectadas e afectadas pelo HIV – e temos dois filhos, de um e três anos. Hoje, se tivesse que escolher entre ter ou não ter o HIV, escolheria ter a infecção. Só sou o que sou por causa do vírus. No começo pensei que a doença era um desastre na minha vida, mas foi ela que me mostrou potenciais que eu nem sabia que tinha. Hoje minha missão é atingir mais pessoas e acreditar nelas. Eu só estou aqui porque alguém acreditou em mim.
(PlusNews)


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