domingo, 4 de maio de 2008

(12) Ágora - A Jota dos retornados



De uma penada, assistiu-se no panorama literário da escrita lusófona ao aparecimento da escrita da geração dos filhos dos que abandonaram Angola, vulgarmente conhecidos em Portugal pelos “Retornados”.

Li em pouco tempo um conjunto de dois livros, que estão em lugares de relevo nos escaparates das livrarias portuguesas: ”Ultimo ano em Luanda” do Tiago Rebelo e “Os Retornados” do Júlio Magalhães.

O Tiago Rebelo, em termos literários para mim não era um desconhecido pois já tinha lido um seu romance, interessante num contexto de neófito da escrita, “O Tempo dos Amores Perfeitos”, em que a acção se desenrola no fim do século XIX, entre Luanda, Malange e a Lunda. Posso adiantar que o livro é prazenteiro, mas em certos aspectos deixa-se assemelhar a algo do tipo ”Emílio Salgari em África”, na sua versão entusiasmante de Sandokan. Em relação ao seu mais recente livro sobre Luanda de 1975, é só um romance, adornado aqui e ali com umas pinceladas à Reis Ventura, misturadas com Pompílio da Cruz, João dos Reis, Mello Machado ou Valdemiro de Sousa, entre tantos outros escrevinhadores que resolveram escrever a esmo sobre “os malfadados Abril de 1974 e Novembro de 1975”!

“O Ultimo Ano em Luanda”, é um romance que fica muito aquém do seu primeiro trabalho, quer no discurso, quer na verosimilhança da história e o repisar constantemente, que “os movimentos de libertação praticamente já tinham desaparecido”, é uma afirmação que dá vacuidade à tentativa de alinhamento com a história.

Numa análise breve ao livro “ Os Retornados”, posso afirmar que é um livro de histórias ouvidas, caldeadas, e no fim o que se pode dizer é que é um romance light sobre “indas e vidas”, mas também com enormes imprecisões, nos sucessivos contextos onde decorre a história do livro. O Júlio Magalhães é um excelente jornalista de um canal de televisão português, é plausível que continue a escrever, e certamente fascinado pela vivência da sua meninice em Luanda e no Lubango, irá fazer trabalhos que certamente poderão merecer mais encómios que este.

Estes livros, são escritos por duas pessoas que deixaram Angola num contexto complicado, mas acima de tudo embarcaram para outras paragens na puberdade, pelo que tudo o que escreveram, foi fruto do que foram ouvindo repetidamente em suas casas, e também no contexto das suas relações pessoais de então, associado a imagens algo desfocadas da infância.

O fascínio por África, tão presente na sociedade portuguesa de hoje, é um terreno fértil para o aparecimento destes romances, um pouco na esteira do sucesso do “Equador” do Miguel Sousa Tavares.

Convenhamos que estes romances enquadram em Angola, um pouco a sociedade do “Out of Africa”(!985), misturado com o “Dark of Sun”, traduzido para português pelo “Ultimo Comboio do Katanga”(1968).

Sem ser o meu género de leitura, posso afirmar que li de forma agradada, o livro do Júlio Magalhães, que recomendo sem qualquer reserva.

No contexto temporal dos romances citados, julgo oportuno recomendar a leitura do Ryszard Kapuscinski, no seu 1975-Angola/ Mais um dia de vida, recentemente reeditado pelo Campo das Letras em Portugal, que é o melhor livro sobre esse período que antecedeu a independência de Angola, opinião naturalmente subjectiva, mas amplamente partilhada.






Pensar e Falar Angola

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