domingo, 12 de agosto de 2007

Entrevista com o Ministro da Saúde

O sonho de quem trata da saúde dos angolanos


ARMANDO RAFAEL

Entrevista com Anastácio Sikato, ministro da Saúde de Angola
Qual é a primeira preocupação de um ministro da Saúde de Angola quando chega ao seu gabinete de manhã?
Em regra, começo por verificar a minha agenda de trabalho. Às vezes, há situações imprevistas que se sobrepõem ao que estava anteriormente programado. Nessas circunstâncias, tenho de decidir se aceito a inclusão de mais um ponto na agenda ou se algum dos que estavam previstos deve ser sacrificado.
Quais são as carências da saúde que mais o preocupam?
A cobertura dos nossos serviços de saúde é uma enorme dor de cabeça. Como fazer para que as populações tenham um verdadeiro acesso aos cuidados básicos? Já no plano da organização, julgo que a principal carência se encontra ao nível dos recursos humanos. Em particular no que respeita aos quadros necessários às actividades de gestão de serviços e de unidades sanitárias...Há outros problemas...É verdade que temos outros problemas, como a falta de infra-estruturas e de equipamento hospitalar, sobretudo ao nível da rede periférica. Também temos com frequência ruptura de stocks de medicamentos. E muitos, muitos outros problemas. Mas se tivéssemos bons gestores por toda a parte o nosso desempenho seria bem melhor.
Problemas como o da cólera ou da malária são irresolúveis ou há outras prioridades em Angola?
Tanto a cólera como a malária estão dentro das nossas prioridades. Mas correspondem a situações diferentes. A cólera resulta das insuficiências que ainda temos no âmbito do o saneamento básico e da disponibilização de água potável à população. São problemas da Saúde... A Saúde paga essa factura porque os doentes vêm sempre ter connosco. Mas posso dizer, com alguma satisfação, que, neste momento, a epidemia da cólera está bastante controlada e estamos a trabalhar para podermos estar em condições de declarar o fim desta epidemia antes do início da próxima época das chuvas.
E a malária?
Resulta de uma infeliz coincidência de factores climáticos, ecológicos e ambientais. Mas declarámos uma guerra sem quartel ao paludismo, beneficiando de várias contribuições financeiras, incluindo estrangeiras.
Quais?
Angola beneficia, por exemplo, da iniciativa George W. Bush para a malária e do Fundo Global para o HIV/sida, tuberculose e malária. Estamos a trabalhar para combater esta endemia. Mas, no contexto actual, não é sensato antever nenhuma data para a sua erradicação.
Se pudesse mudar alguma coisa de um momento para o outro, o que é que mudaria?
Está apostado em fazer-me sonhar, não é? Muito bem. Ficaria muito feliz se me deitasse num dia e ao acordar tivesse o Serviço Nacional de Saúde (SNS) apetrechado de quadros quantitativa e qualitativamente necessários ao seu funcionamento. Com isto, quero deixar bem claro que dou muita importância aos recursos humanos. Tomara eu ter os quadros que o sistema precisa! Mas isso é impossível. Os quadros levam muito tempo a formar e "crescem" à velocidade do desenvolvimento do SNS, que é também reflexo do desenvolvimento do próprio país.
Sente que é ministro da Saúde de Angola ou a sua acção está limitada apenas a Luanda?
Sou o ministro da Saúde de toda Angola! Mas tenho consciência de que a minha autoridade não se faz sentir de forma equilibrada em todo o país.
Faz sentido falar em Ministério da Saúde para quem vive no Moxico, no Cunene ou em Cabinda?
As províncias angolanas têm alguma autonomia. É natural. Muitas têm o tamanho dos países europeus.
E qual é o papel do ministério?
Ao Ministério da Saúde cabe integrar os diversos serviços provinciais. Neste momento, por exemplo, estamos em fase avançada do processo de elaboração da Política Nacional de Saúde. Quando for aprovado, será um documento consensual que afectará todas as províncias do nosso país. Ao fim e ao cabo, o desenvolvimento de um sistema de saúde leva vários anos."QUEREMOS SERVIÇOS EFICAZES"
Já visitou algumas das províncias angolanas mais distantes de Luanda desde que é ministro?
Já. No Dia Africano da Luta contra a Malária, que se comemora a 25 de Abril, estive em Malanje. Há dois meses, acompanhei a visita do primeiro-ministro a Benguela. Mas tenho várias visitas programadas.
Nessas visita, o que é que as pessoas lhe disseram?
Tanto em Malanje como em Benguela, recebi uma mensagem de confiança no futuro. Há dificuldades, mas transmitiram-me uma palavra de esperança.
Quais foram as reivindicações?
As pessoas querem mais especialistas e hospitais mais bem equipados. Já os quadros pedem melhores condições. A começar pelos salários. Todos reconhecem que o país fez progressos, mas ainda não se conseguiu atingir um salário capaz de cobrir as necessidades básicas dos quadros e das suas famílias. Mas também houve pedidos de reciclagem. Há uma sede imensa de saber que afecta sobretudo os técnicos mais jovens.
A reabilitação dos hospitais públicos já se sente no dia-a-dia?
Sim, mas o ministério tem a consciência de que agora é preciso dar passos complementares. É preciso que nessas unidades sanitárias haja serviços que funcionem de forma eficaz, com pessoal qualificado. É um desafio imenso...Não quero pintar o quadro sanitário angolano de cor-de-rosa. Sabemos que há muitas, mas muitas dificuldades. Mas garanto que vamos tentar abordar cada uma delas, sabendo que o que há a fazer ainda levará o seu tempo até dar resultados.
Em que é gasta a maior fatia do orçamento da saúde em Angola?
Neste momento, nos investimentos públicos. Em segundo lugar, nos bens e serviços. E, em terceiro, nas despesas de pessoal.
Quer precisar melhor?
Quando falo em investimentos públicos, estou a falar de grandes obras que o Governo está a fazer no sector. Algumas são mesmo novos edifícios, outras são de reabilitação. Nos bens e serviços, estão incluídos os medicamentos, o material gastável e diversos serviços, como, por exemplo, os serviços de hotelaria dos hospitais ou as acções de saúde pública, como é o Programa Alargado de Vacinações. As despesas de pessoal são essencialmente os salários, os subsídios e os programas de formação. A cooperação internacional também pode ajudar... É indispensável. Damos muito valor às parcerias que podem firmar-se entre o nosso país e outros países, quer entre estruturas do Estado, quer entre privados. Só temos uma condição: que os programas sejam do interesse das duas partes e duradouros.
Como avalia a cooperação com Portugal?
Vai bem. Há programas em curso e outros que estão ainda em discussão. Mas ainda recentemente firmámos um acordo que reforça essa cooperação. Mas não é de mais realçar que as parcerias com outros países não se esgotam no relacionamento entre as instituições dos dois Estados, pois há também lugar para parcerias público-privadas. E, neste domínio, estamos disponíveis para analisar todas as ofertas que nos forem apresentadas. - A. R.

Pensar e Falar Angola

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