CAMACOUVE

Aqui está um ícone que sempre viveu no meu imaginário e que ao longo da minha vida me tem acompanhado. Este comboio, tipo salada russa, que tanto levava vagões de mercadorias como carruagens de passageiros e que lá na banda resolveram chamar de Camacouve, porque tinha camas e levava couves - digo eu - segundo reza a lenda, foi o sonho das minhas viagens. Só fiz duas ou três viagens neste comboio quando visitava o Bongo e a sua missão. Deslocava-me aí em "negócios", mal sucedidos diga-se, com o Dr. Parson, saindo cedo do meu Huambo e apanhando o ar fresco da manhã naquele rame-rame que se prolongava por horas. Era lindo de ver a "cobra" a subir a serra do Lépi, ouvir o nascer do dia e sentir o cheiro da terra que se modificava pelo dia em diferentes aromas. Um dia, pensei, quando acabarem com isto ficarei mais só e sem imaginação para sonhar. Era aqui, nestas carruagens, que eu um dia cheguei à conclusão que na minha Angola havia muitas pessoas que não eram todas iguais e que contavam histórias que a professora Maria nunca me tinha contado na escola do Bairro. Comecei a sentir que aquela treta do Império era ficção e que só nos filmes mais foleiros é que passava a epopeia dos igrejos avós. Eu queria era ouvir, ver, falar e pensar no que se dizia naquele Camacouve.
Hoje sei que estou mais só, numa encruzilhada, sem saber se ainda sei sonhar.
Pensar e Falar Angola

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