segunda-feira, 11 de junho de 2007

As mulheres do meu pai

A verdade é que não sei ainda se a amo ou se a odeio. Falo de Luanda. A vivenda do general N'Gola fica no centro de um pequeno jardim tropical, com palmeiras, bananeiras, um lago redondo com repuxo e peixes vermelhos. Havia diversas mesas de ferro dispostas ao redor de uma piscina muito bonita. As pessoas conversavam tranquilamente. Bebiam e comiam. À mesa em que nos sentaram estava um jovem empresário – "importo vinhos e bebidas espirituosas", disse-me, ao apresentar-se – acompanhado pela mulher, uma rapariga gordinha, com um rosto perfeito, recém-formada em economia no Rio de Janeiro.
Estava ainda um rapaz alto, de ombros largos, que me cumprimentou com alegre irreverência:– Tia Laurentina, acertei?, a avó contou-me.
Houve quem tivesse feito apostas sobre quantos filhos do avô Faustino, filhos desconhecidos, claro, iriam aparecer no funeral. Apareceram dois, você e um militar, lá do Sul...Devo ter corado.
Ele percebeu o meu desconforto:– O que é isso? Não se zangue. Você faz parte da família. Lamento que não tenha conhecido o velho em vida. Ele era uma pessoa extraordinária. Estamos todos felizes por você ter aparecido. Eu, em particular, que ganhei uma tia tão bonita. Ainda não me apresentei? Perdão, chamo-me Bartolomeu, Bartolomeu Falcato, e sou o filho mais velho da Cuca...
Mandume interrompeu-o:– Quantos filhos teve o seu avô?
Bartolomeu riu-se. Riram-se com ele o empresário e a mulher.
– Segundo o avô dizia, 18. Sete mulheres e 18 filhos.
– Era um homem africano – o empresário piscou-me o olho cúmplice.
– Aqui em África ainda sabemos fazer filhos, não é como vocês lá na Europa. Quem está a salvar a Europa da implosão demográfica são os imigrantes africanos. Os europeus deixaram de fazer filhos. Têm, presumo eu, outras coisas com que se ocupar...
– Quantos filhos tem você?
– Eu?! Só um, mas eu ainda sou muito novo...
– Muito novo? Tens 33, meu camba. Aqui na terra já és cota. – Bartolomeu dizia isto às gargalhadas. – Lembra-te que a esperança de vida em Angola é de 42 anos. Já uma criança que nasça em Portugal pode viver 77 anos. Um angolano de 33 anos equivale a um português de 68. A tia tem razão, enquanto africano tu és uma fraude!
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