Estou a escrever esta crónica no dia 15 de Janeiro de 2010. Há precisamente trinta e cinco anos no Alvor, Algarve, virava-se uma página determinante na história de Angola, no fim de uma cimeira de cinco dias, Portugal e os representantes da UNITA, FNLA e MPLA, acordavam a independência do território em 11 de Novembro de 1975, e os termos da transição do poder colonial para as novas autoridades do País a emergir.
Estou aqui rodeado de revistas, documentos, jornais e comunicados da época, e revejo com nostalgia esses dias de Janeiro de 1975, que acompanhei tão intensamente de perto.
Nesses dias movimentados, na circunstância, num cálido inverno algarvio, estabeleceram-se alguns princípios, camuflaram-se desconfianças e conseguiu que saísse o “Acordo do Alvor”, que estabelecia as regras mínimas da organização de um governo e uma forma algo pueril de manutenção da ordem no território, a partir desse momento sob administração portuguesa partilhada com movimentos de libertação.
Não vou perder muito tempo a falar do acordo do Alvor, nem dos cinco dias em que as delegações estiveram fechadas no Hotel da Penina, porque já se especulou o suficiente, e cabe agora aos historiadores fazerem o balanço desses dias da esperança para o povo de Angola.
O resultado imediato não foi bom para muita gente, mas a realidade é que trinta e cinco anos volvidos, valeu a pena, mesmo com o tempo em que houve coisas que não correram bem.
Trinta e cinco anos pode ser muito tempo na vida de uma pessoa, mas é uma gota de água no processo histórico de uma nação.
Os acordos do Alvor foram o princípio do fim de uma etapa de luta, de que o 11 de Novembro foi um parto difícil, mas conseguido “a golpes de vontade” (Ary dos Santos).
Quando há quatro anos, Angola foi ao Mundial de futebol, repetiu-se-me a euforia que sempre mantive desde Novembro de 1975, quando vejo a bandeira do País. Mas nessa altura a minha euforia era maior, porque vi por todo o lado a bandeira, e achei que se tinha dado a estocada final numa estulta ideia, de se fazer em Angola uma nova bandeira, como chegou a ser proposto por uma comissão!
Hoje é impossível mudar a nossa bandeira, porque na realidade passou a fazer parte da nossa forma de estar angolano, e agora no CAN, em que a “bandeiromania” tomou conta de todos, e já ninguém se lembra do projecto que ganhou, mas que convenhamos também não tinha entusiasmado ninguém.
O projecto que ganhou, que terá aparecido de uma ideia peregrina de “unidade nacional”, mais não foi que uma tentativa de promover divisões e gastarem-se uns dinheiros. Felizmente por omissão, imperou o bom senso, senão arriscávamo-nos a ter um arremedo de imitação da bandeira da Costa Rica, e também um pouco parecida com as toalhas de praia, que uma determinada marca de cremes para a pele ofereciam na compra de um pack de dois gel corporal e uma bisnaga anti-rugas.
Angola já ganhou o CAN, nalgumas coisas, e numa delas nesta euforia das bandeiras o que demonstra que as pessoas querem a que sempre conheceram, a da catana, roda dentada, estrela num fundo vermelho e preto.
Diziam que era a bandeira do MPLA, e daí? A bandeira da Namíbia não é uma cópia aproximada da SWAPO?, a da Guiné-Bissau não é a do PAIGC (que já acabou)?, a de Moçambique não é a da FRELIMO, a de Portugal não era, do extinto em 1926 ,Partido Republicano Português, a de França não foi a que saiu da Revolução Francesa no fim do século XVIII?, a DA Republica Popular da China não é a do PCC de 1949? e por aí fora, nunca mais saindo daqui, com exemplos, e as bandeiras por norma são escolhidas por um determinado momento histórico e prevalecem no tempo. No caso da nossa coincidiu com esse nunca esquecido 11 de Novembro de 1975.
A minha eterna alegria no País, entre outras, é ter os símbolos que vi nascer com ele. Se acabarem com eles depois de eu morrer, já pouco me interessa, mas até lá deixem-me ver o sonho acordado todos os dias, com a nossa bandeirinha negra, vermelha e amarela com os símbolos que a gíria popular resumiu de forma exemplar: “Se não entras na engrenagem levas uma catanada que até vês estrelas”!
Fernando Pereira
15/01/2010
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