quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Conferência de imprensa dada hoje pelo presidente da UNITA, Isaías Samakuva.

A UNITA, na voz do seu Presidente explica os motivos que levaram à apresentação da Moção de Censura ao Governo de Angola

É dever deste blog, que tenta abordar todos os assuntos que a Angola digam respeito, quer entrem no âmbito da política ´pura', quer entrem por campos meramenta lúdicos, abordar um tema político levantado por um dos partidos da oposição. Quanto mais não seja porque assim se faz a democracia. É evidente que temos as nossas opiniões, que as transmitimos ou não conforme as nossas vontades, a nossoa pluralidade de pensamento, uma vez que somos um blog colectivo.

25 DE NOVEMBRO DE 2009


Senhores jornalistas,
Minhas senhoras e meus senhores:

Cumpre-me informar-vos que a UNITA apresentou à Assembleia Nacional, uma Moção de Censura ao Governo da República de Angola, pelos incumprimentos e desvios dos objectivos e políticas aprovados pelo Plano Nacional de 2009.

Esta moção, apresentada em nome do Povo que representamos e nos termos dos Artigos 88º e 116º da Lei Constitucional, reflecte a censura ou a reprovação que o povo vem fazendo à política de exclusão social, às demolições arbitrárias das casas do povo, aos desvios do erário público e à corrupção, que cresce todos os dias!

Estamos aqui para explicar com algum detalhe as razões da Moção e comentar as intenções de medidas correctivas expressas pelo Senhor Presidente da República, quando falava aos dirigentes do seu Partido na semana finda.

Nos termos do Artigo 105º da Lei Constitucional, o Governo é responsável politicamente perante o Presidente da República e perante a Assembleia Nacional, a quem cabe fiscalizar o Governo, na defesa dos interesses do povo. O dinheiro que os membros do Governo desviam, como referiu o próprio Chefe do Governo, pertence ao povo. Os Deputados devem proteger e controlar este dinheiro.

Através da moção de censura, de iniciativa parlamentar, os representantes do povo põem em jogo a responsabilidade política do Governo. Significa dizer, que este Governo não merece mais a confiança do povo, ou seja, precisa de tolerância zero, como reconheceu o próprio Chefe do Governo.

Além de se tratar de uma responsabilidade política, trata-se também de uma responsabilidade parlamentar do Governo. Isto implica a responsabilidade solidária de todo o Governo perante a Assembleia Nacional e não a responsabilidade individual dos Ministros.

Portanto, é necessário que os angolanos saibam os nomes dos gestores públicos que o Senhor Presidente da República referiu como “pessoas irresponsáveis e gente de má fé.” É necessário responsabilizar os Ministros, Governadores, políticos ou gestores, antigos ou actuais que, nas palavras do Chefe do Governo, esbanjaram recursos e praticaram actos de gestão ilícitos.

É necessário que os angolanos saibam quem são eles e como fizeram isso. É necessário que o povo saiba quais as verbas envolvidas e quais foram os efeitos ou danos causados à economia. Não basta a autocrítica. Se quisermos mesmo ser sérios, o Estado de Angola não deve esperar que um Partido político realize o seu Congresso para responsabilizar os que agiram e agem de modo irresponsável e causam danos à economia e ao tecido social, de tal gravidade, que exija a tolerância zero.
O Senhor Presidente da República falou também de “actos danosos ou fraudulentos.” Os angolanos precisam de saber os detalhes da dimensão da fraude, bem assim como os seus autores materiais e morais.

Este não é um problema do MPLA. Os recursos roubados não pertencem ao MPLA, pertencem a todos os angolanos. As fraudes referidas pelo Presidente da República não foram feitas contra o MPLA. Foram feitas contra Angola e contra todos os angolanos. É por causa destes roubos e destas fraudes, que os angolanos sofrem todos os dias, os preços sobem todos os dias e o dinheiro das famílias nunca chega!

A moção de censura ao Governo incide, não sobre as obras físicas que programou, nem sobre os estádios de futebol e as estradas que mandou construir. Incide sobre as comissões, sobre facturações e os desvios do erário público para financiar empreendimentos privados. A moção de censura não incide sobre os empréstimos que o Governo contrai. Incide sobre os fundos que eventualmente são desviados destes empréstimos para contas particulares, em Angola e no estrangeiro. A moção de censura incide sobre aquilo que o Governo prometeu aos angolanos que iria fazer em 2009 e não fez, não por causa da crise, mas por causa da má gestão e da corrupção. Incide sobre todo este ambiente de corrupção institucionalizada.

Minhas Senhoras e meus senhores;

No seu programa, os novos governantes comprometeram-se a “reforçar a democracia, respeitar os direitos humanos, melhorar a qualidade de vida dos angolanos, combater a corrupção, melhorar a governação e consolidar a estabilização política do país.”
Feito o balanço do desempenho do Governo no cumprimento do seu programa e do Plano Nacional aprovado para 2009, o sentimento geral dos diversos sectores da sociedade converge numa só constatação: Angola piorou.

No lugar de defender e promover a democracia, o Governo asfixiou a democracia, a igualdade. Não há igualdade de tratamento dos cidadãos e dos Partidos políticos. Não há liberdade na imprensa pública. Os órgãos de comunicação social do Estado pioraram a sua actuação na negação à pluralidade de ideias, foram subvertidos e transformados em instrumento de um só partido, tornando-se, assim, nos principais obstáculos ao desenvolvimento da democracia angolana. Há, portanto, uma subversão da democracia.

No lugar de promover a inclusão e aumentar o bem-estar social dos angolanos, o Governo implementou políticas que acentuaram as desigualdades e a exclusão social;
O Governo continuou a violar os direitos sociais, económicos e políticos dos angolanos, quer por via do esbulho das suas terras, quer pelas demolições arbitrárias das suas casas, quer pelos salários de miséria que promove.

A Universidade Católica, a imprensa e outras organizações, efectuaram estudos para provar aquilo que o povo sente na carne todos os dias: que as políticas adoptadas em 2009 pelo Governo, agravaram a pobreza, agravaram a má qualidade do ensino público, dos serviços de saúde e o fornecimento deficiente de água e luz. Os empresários que fazem negócios com Angola, os Bancos onde os governantes depositam o dinheiro que desviam dos cofres do Estado, as organizações internacionais, os jornalistas, os Embaixadores, os comerciantes, toda a gente sabe que a riqueza que a classe dirigente do MPLA exibe, no país e no estrangeiro, não foi ganha com honestidade; foi roubada ao povo angolano. E isto piorou em 2009.

Angola voltou a descer na lista dos países que governam com transparência e que combatem a corrupção. Angola estava no 147º lugar, agora desceu para o 158º lugar.

Em 2009, o abuso do poder, o nepotismo e o enriquecimento ilícito tornaram-se impuníveis. Os novos endinheirados exibem impunemente, em entrevistas na imprensa, as fortunas que fizeram, desviando os dinheiros públicos e fazendo negócios consigo próprios, ou controlando monopólios e cartéis, através de seus familiares. São referidos como “grupos angolanos,” que compram empresas e acções, constroem torres com dinheiro que não é deles e esbulham as terras do povo! São eles que controlam os preços. São eles que, devido a ausência de concorrência e protecção do Governo, encarecem o custo de vida da maioria mais pobre! São eles os novos capitalistas exploradores, que, na prática, utilizam o MPLA, um Partido de tradição social, concebido para defender os mais desfavorecidos, para explorar os trabalhadores angolanos e aumentarem os seus lucros. E fazem isso sob a protecção de políticas públicas discriminatórias, promovidas pelo Governo.

Ficou evidente, no decurso de 2009, que Portugal tornou-se um destino seguro de fortunas desviadas do erário público angolano. Em Julho de 2009, a imprensa noticiou o depósito, na Banca portuguesa, da soma de $380 milhões, de proveniência angolana duvidosa. Advogados portugueses denunciaram, a propósito, que havia pressões sobre José Sócrates, Primeiro-Ministro português, para libertar milhões de dólares de dinheiro público para determinadas contas privadas de alguns mandatários do regime angolano, de forma a continuarem a comprar até empresas falidas, para branquearem dinheiro roubado do povo de Angola.

Perante todas estas denúncias repetidas de promiscuidade entre negócios públicos e privados, pelas mesmas pessoas, o Governo manteve-se surdo, inoperante e conivente;

Por outro lado, a iniquidade da política de distribuição e redistribuição da riqueza nacional agravou o fosso entre ricos e pobres. Enquanto em 2002 a diferença entre ricos e pobres era medida por um coeficiente técnico de 0,55, os especialistas estimam que tal diferença, o índice de gini, subiu para 0,63, em 2009, o que tornou Angola no país com mais disparidade entre ricos e pobres, a nível mundial, segundo o estudo do Centro de Estudos e Investigação Científica da Universidade Católica de Angola.

Minhas Senhoras e meus senhores

Perante a censura feita pelo povo e pelo Chefe de Estado, quais são as medidas sancionárias que a democracia ensina e a Lei estabelece?

Como o Governo foi eleito para governar no interesse do povo e proteger os bens do povo, mas acabou por agir de modo irresponsável, com má fé, governando contra o povo e desviando os bens do povo, o Governo deixou de ter a confiança do povo. Por isso, o Governo deve ser demitido.

A tolerância zero significa demitir o Governo, em primeiro lugar. Não devemos esperar, o tempo para agir é agora!`
Os angolanos não acreditarão em nenhuma tolerância zero se o Governo não for demitido. Porque o nosso Presidente da República ainda é o Presidente interino referido no Artigo 72° da Lei Constitucional, o actual Presidente não pode dissolver a Assembleia Nacional. Mas pode demitir o Governo e nomear um novo Primeiro-Ministro e novos Ministros, com base nos resultados das eleições de 2008.

Não se trata de danças de cadeiras. Se quisermos ser sérios e aplicar a tal tolerância zero, temos de aplicar a Lei com o devido rigor. Não podemos utilizar a corrupção para fazer jogadas políticas ou avançar agendas pessoais. Temos de reconhecer que a responsabilidade pela governação, boa ou má, é do Chefe do Governo. E no nosso sistema político, o Chefe do Governo é uma função que deriva, não da eleição dos Deputados, mas da eleição directa do Presidente da República. O Chefe do Governo é o Senhor Presidente da República. Assim ficou estabelecido pelo Acórdão do Tribunal Supremo, nas vestes do Tribunal Constitucional, em 2005. Responsabilizar o Chefe do Governo significa responsabilizar o Presidente da República. E aplicar a tolerância zero na responsabilização, significa realizar a eleição do Presidente da República.

Esta eleição deveria ser realizada em 2009, conforme recomendou o Conselho da República. O Presidente da República aceitou tal compromisso, em Dezembro de 2006. Os angolanos querem também a tolerância zero no cumprimento da Lei e dos compromissos assumidos.

Os angolanos não votaram para se adiar a eleição presidencial para depois da aprovação de uma nova Constituição. Os angolanos foram às urnas, cientes de que escolheriam os Deputados em 2008 e o Presidente da República em 2009. Este foi o compromisso assumido. Ninguém pode, em boa fé, dizer que o resultado da eleição de 2008, anula o compromisso assumido de realizar as eleições presidenciais com a mesma Lei que serviu para realizar as eleições legislativas.

Por todas estas razões é que o povo angolano vem censurando este Governo. E foi em representação deste povo, que sofre todos os dias, que é enganado e roubado todos os dias, que a UNITA apresentou uma Moção de censura pelos incumprimentos e desvios dos objectivos e políticas aprovados pelo Plano Nacional de 2009.

Muito obrigado
Isaías Samakuva

Pensar e Falar Angola

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