domingo, 15 de março de 2009

(56) - Àgora - Angola, Trincheira firme da revolução em África




Resolvi arrumar umas tralhas que cá vai havendo por casa, tentando que desta vez não me irritasse, e pegasse em parte das coisas que desarrumei e fosse colocar no lixo. Arrependo-me sempre mais tarde de o ter feito, porque nestas movimentações já se perderam verdadeiras pérolas.Pego aqui numa bandeirinha, das que agitávamos aí nos anos 70 e 80,quando algum dignitário estrangeiro nos visitava, numa “manifestação espontânea”, assim do tipo “sábado vermelho” ou campanhas de “emulação socialista”, e vejo uma das frases mais extraordinárias dos nossos tempos revolucionários: “Antes morrermos todos que deixar passar o inimigo”. Esta frase é o máximo do kitschismo do léxico revolucionário. Assim do mesmo tipo, só esta: “Que importa que o inimigo ataque ao amanhecer se as FAPLAs não dormem.”No ano de 1980 o slogan oficial era “Ano do Congresso Extraordinário do MPLA-Partido do Trabalho, e da Criação da Assembleia do Povo”, que precedeu o 1979 “Ano da Educação”e o de 1978, “Ano da Agricultura”. Em 1981 foi “o Ano da Disciplina e do Controlo”, e o em 1982, “Ano da Organização Económica e da Vigilância Popular” , 1983 o “Ano do Reforço da Organização” e por aí fora.Frases do tipo “Somos independentes, Seremos socialistas”, “Mais Unidade, Melhor Organização, Maior Produção”, “No socialismo a agricultura é a base e a industria o factor decisivo”, ou “Fieis ao Presidente Neto lutemos pela independência económica” profusamente distribuídas em outdoors colocados pelo País , dentro do quadro geral do “Produzir para Resistir”.Vem-me à memória, slogans que nos entusiasmavam num período em que muitos de nós tínhamos outras opções, e ainda hoje sentimos nostalgia de algumas do tipo: “Firmes nas trincheiras, decididos na produção”, “Estamos em guerra e cada cidadão é e deve sentir-se necessariamente um soldado”, frase do Presidente Agostinho Neto, de um discurso em que apelava para uma batalha generalizada pela mobilização de recursos humanos e materiais visando a defesa do território.Continuando este artigo preguiçoso, recordo que “A disciplina é um factor determinante na vitória de toda a Revolução”,” Por cada combatente da liberdade que tomba mais aumenta a nossa raiva contra o inimigo invasor e imperialista”, e a quase trinta anos de distancia, estas e outras palavras de ordem fazem-nos recordar momentos imorredoiros na vida do debutar de um País.Há várias palavras de ordem que foram mazinhas q.b, e uma delass sinceramente só me deixou descansado quando desapareceu, pois dizia isto apenas “A Produção liberta o homem”, e sinceramente associei sempre esta frase às palavras sinistras que encimavam a entrada do campo da morte de Aushwitz .“A Luta Continua”, a “Vitória é Certa”, tem sido imagens de marca, depois de durante muitos anos terem acompanhado o “Viva o Poder Popular”, que começou a cair em desuso quando o fato de marca e a gravata, substituiu o interessante “safari”, mais adaptado aos rigores do clima, mas menos vistoso!Como tudo isto foi decorrendo durante o período do “cinturão de FAPLA”, que era nem mais nem menos que o nome do peixe -espada , que a par do carapau frito, “personagens” emblemáticas e recorrentes de um determinado período de mingua da gastronomia angolana.Um dia estava no Polo-Norte, uns dias antes de encerrar de vez, ali no prédio da Sonangol, e resolvi comer o carapau frito com arroz, que me dava direito a dois búlgaros de cerveja, tudo isto numa ponta do balcão, já que o snack bar não tinha mesas.Ao meu lado estava um indivíduo, que dizia textualmente isto:” És um herói, os portugueses bazaram mas resististe, os sul-africanos foram e tu resististe, os zairenses fugiram e resististe, o socialismo científico instalou-se e tu resististe, és o único que nunca largou esta”trincheira firme da revolução em África”. Olhei para o lado para tentar ver com quem falava o meu companheiro ocasional de repasto, e vi que era um discurso para efectivamente um enorme resistente: O carapau que estava no prato, fritinho e emoldurado por um pastoso arroz branco.Tempos bons, dos” 11 poemas em Novembro” do Manuel Rui Monteiro ,e do Zito, cozinheiro na casa do desportista, coordenador de célula do MPLA-PT nos Desportos, que me respondia às minhas duvidas sobre a implantação do socialismo em Angola, da seguinte forma: “Camarada Fernando Pereira, o nosso socialismo não é um socialismo qualquer, é diferente dos outros, é científico”!!!


21-02-2009




Pensar e Falar Angola

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