domingo, 5 de dezembro de 2010

145 - Ágora - "AVULSISES"



Horácio Sá Viana Rebelo, foi governador-geral de Angola no período entre 1957 e 1960. Para além de ser um sportinguista dos quatro costados, e a quem se deve a edificação do complexo desportivo e sede do Sporting de Luanda junto ao estádio dos Coqueiros, a sua passagem pela colónia foi marcada por algum crescimento económico, face à excelente cotação do café no mercado internacional na primeira metade da década de 50.


Por falar em Sporting de Luanda, não posso deixar de trazer à lembrança uma frase emblemática do Luis Vaz, presidente vários mandatos, numa entrevista ao semanário Notícia no início da década de 70: “ A minha relação com o Benfica é esta: A única coisa que eu tenho vermelha em casa é o tapete, onde esfrego os pés e entro com os sapatos limpos em casa”. Luis “Verde”, como também era conhecido, quando se referia a alguém do Benfica dizia que “só conseguia usar uma linguagem: a tiro!”. Esta frase testemunhei-a eu, quando ele discutia com prosélito sportinguismo um Sporting-Benfica, que tinha estado a comentar durante horas com os decibéis desregulados, após ouvir entusiasmado o relato na Emissora Nacional portuguesa em onda curta.

Voltando a Sá Viana Rebelo, havia uma história em Angola, que sugestionava que a pousada de Kalandula, ao tempo Duque de Bragança, teria sido feita para servir o casamento de sua filha. O local era paradisíaco, mas a realidade é que a pousada nunca conseguiu qualquer viabilidade económica, para além de uma progressiva degradação, e já só abriu com alguma regularidade no toque a finados da presença colonial portuguesa em Angola.

Visitei-a, miúdo nos anos sessenta, quando o asfalto era só até ao Lombe, lembro-me de a ver fechada, com vidros estilhaçados, e com o equipamento cheio de ferrugem, assim como os elevadores completamente deteriorados.

A pousada foi feita a meio da encosta, onde se avistava toda a monumentalidade das quedas, mas também levava com a “espuma” provocada pelas águas revoltas do Lucala, e que assim levou ao deteriorar rápido de uma estrutura, que nasceu debaixo de fortes suspeitas quanto à sua real utilidade e necessidade. Citando o angolano Fausto Bordalo Dias numa das suas canções: “Atrás de tempos vem tempos e outros tempos hão-de vir”!

Mudando de assunto, na busca de algumas histórias da história algo rocambolesca que foi a construção do Caminho de Ferro do Ambaca, e que depois das vicissitudes da sua falência, se transformou no Caminho de Ferro de Angola, vai de Luanda a Malange, ficando para ser continuada até ao Luau, depois de ter sido alterado o plano inicial, que previa ir do Lucala à então Leopoldeville (Kinshassa), descobri que Bento Gonçalves (1902-1942), primeiro secretário-geral do Partido Comunista Português foi trabalhador das oficinas do CFA.

Efectivamente, na busca de melhores oportunidades resolveu deixar o Alfeite (ao tempo Arsenal da Marinha em Lisboa), onde trabalhava e entre 1924 e 1926, tendo sido um propulsor de um movimento sindical com alguma importância ao nível dos Caminhos de Ferro de Angola, o que o levou a “ser convidado a regressar a Portugal”. 

Preso em 1936, faleceu no Tarrafal, Cabo Verde em 1942 com a biliose, e ainda hoje é uma referência para os comunistas portugueses, pelo estoicismo com que enfrentou a doença na dureza das condições do campo, como documentaram para memória futura alguns colegas seus de cativeiro. 

Sem pretender ser pérfido, sobre os novos olhares sobre o Tarrafal, no politicamente correcto branquear da história, o que se pode dizer é que Bento Gonçalves “morreu na praia”!

Acho que a estultícia, para ter alguma verosimilhança, e ser levada a sério também terá os seus limites, e certa gente merece respeito, pelo empenho que demonstraram na luta, mesmo que as diferenças ideológicas existam!



Fernando Pereira

28/09/2010


Pensar e Falar Angola

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