terça-feira, 2 de junho de 2009

Dois Povos, Duas Nações

CONVITE
Helena Justino convida a visitar a sua exposição de Pintura "Dois Povos Duas Nações". A exposição estará aberta até 12 de Junho, de segunda a sexta, das 8h30 às 18h30.
Os melhores cumprimentos
GROUPAMA ARTE - Avenida de Berna, 24-D 1069-170 LISBOA

“Dois Povos, Duas Nações”, intitulou a Helena Justino esta exposição que pretende, antes de mais, falar sobre Angola e Portugal e a sua proximidade em vários níveis, pese muito embora os remoques de um lado e do outro, que mais não são do que amuos de irmãos desavindos, mas irmãos.
É evidente que, se há muitas diferenças, no modo de vida, no modo de encarar o mundo, e especialmente na cultura, quando analisados bem de perto, neste mesmo plano, apresentam semelhanças inesperadas. Queremo-nos referir, como a artista quer assinalar nesta mostra, à semelhança evidente e surpreendente das máscaras usadas pelos dois povos, quer tenham em Angola o nome de muquixes, quer tenham em Portugal o nome de caretos. O seu significado e objectivos aparecem-nos com paralelismos inesquecíveis, quase inacreditáveis.
Por isso mesmo, não resisto a contar um episódio de que fui participante durante o exercício da minha profissão como chefe de programas da Televisão Popular de Angola, Luanda, em 1977, e que aliás já contei no meu livro “Angola – Estórias Esquecidas”, por explicar de forma muito sucinta e esclarecedora o que a artista teve em mente ao fazer esta exposição.
Tinham-se passado dois anos após a independência, os ânimos contra os colonialistas portugueses estavam mais acalmados, e o director-geral da TPA, o conhecido escritor Luandino Vieira, achou por bem que o meu programa "Cinema em Positivo e Negativo" já poderia incluir um ciclo dedicado ao cinema português. No final do ciclo, projectou-se, como complemento, uma sessão dedicada ao documentarismo português, que incluiu o documentário de Manuel Costa e Silva "Festa, Trabalho e Pão em Grijó de Parada", que tinha sido para mim, quando do seu visionamento, uma revelação.
"Festa, Trabalho e Pão em Grijó de Parada" tem por tema básico a festa de Santo Estevão, também conhecida como a festa dos Caretos, comemorada anualmente na citada aldeia transmontana no dia de Natal, e que é, além da celebração do solstício de Inverno, um ritual de iniciação dos jovens aldeãos, que antes de entrarem definitivamente na idade adulta vão, nesse dia, de casa em casa, fazer um peditório de géneros que depois serão alvo de um bodo durante o qual já podem, pela primeira vez, fazer uso de bebidas alcoólicas.
De vários modos se pode fazer um paralelismo com as festas de circuncisão praticadas desde tempos ancestrais em todas as antigas sociedades tribais africanas, em especial as bantus, tomando em Angola o nome de Mucanda, que em quimbundo significa carta, mensagem, cerimónia que o grande escritor Castro Soromenho, actualmente quase esquecido, tão bem descreveu num dos seus mais interessantes livros de divulgação.
Por exemplo, em Grijó de Parada, os jovens aldeãos também se vestem com artefactos de palha, igualmente garridos de cores vivas e também igualmente utilizam máscaras, daí a designação de festa dos Caretos.
Normalmente, a "Régie" da TPA funcionava como todas as televisões em qualquer parte do mundo, isto é, quando passava um filme de maior duração, os restantes intervenientes da emissão conversavam, trocavam sarcasmos, contavam anedotas, enfim, tudo menos olhar para os visores, que para isso estava lá o realizador responsável para avisar alguns minutos antes de acabar.
Nessa noite, porém, ao fazer a minha ronda habitual pela "Régie", comecei por ficar alarmado. Ao contrário do bulício de sempre, todos os elementos, desde o sonoplasta, o meu compadre Jofre Neto, à anotadora, a Anabela, estavam quietos e mudos olhando com uma atenção inesperada a projecção do documentário "Festa, Trabalho e Pão em Grijó de Parada". Tento saber o que se passa, pelo menos uma explicação, mas toda a gente me pede para falar depois. Agora queriam ver aquele filme. E foi com emoção que assisti de novo à sua exibição, agora perante uma plateia denodadamente interessada, o que dá outra dimensão como espectáculo e como manifestação.
Não precisei de fazer perguntas no fim. O comentário do Manuel Eugénio, operador de câmara, actualmente a trabalhar na delegação da CNN em Luanda, esclarecia tudo:
- Ah! Mas afinal os portugueses são como nós!
O que séculos de convívio opressor não alcançaram, tinha-o conseguido o cinema, a arte das imagens em movimento. Como todos os povos - é bom esclarecer muitos dos nossos patrícios portugueses que julgavam que logo que atravessavam o Equador já se julgavam donos de Angola - também os africanos se julgam no centro do mundo, aliás não é por acaso que "bantu", de bantu quer dizer "os homens".
A pintura de Helena Justino não tem a ‘dimensão’ do movimento, mas o seu objectivo é o mesmo, utilizando a emoção das cores fortes e o encanto dos tons que só conhecimento do sol africano e a convivência com o vermelho-ocre da terra angolana podem transmitir.
Rodrigues Vaz



Pensar e Falar Angola

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