Alguns subsídios para a História de Angola, que corre o risco de ficaraltamente desvirtuada, se casos desses não forem recolhidos a tempo
Rui Albino
(Nota Pessoal:
1º Esclarecimento - Desconheço este caso, é certo. No entanto, todos os que viveram em Angola neste período conviveram com histórias afins, contadas nos silêncio das noites angolanas, (sem televisão para incomodar os diálogos), onde se relatavam mortes terríveis, de ambos os lados, portugueses e ou luso angolanos e angolanos;
2º Esclarecimento, o autor do texto abaixo, publicado no Semanário Angolense, erra quase garantidamente em um pormenor – em 1961, no Uíje o MPLA não tinha qualquer impacto, sobretudo no norte de Angola, mas sim a UPA liderada por Holden Roberto. Assim, ou a historia relatada, esta em concreto, não é verdadeira, ou a sigla que terá servido para agregar as populações só pode ter sido a da UPA. Já o Massacre da Baixa do Kassanje esse sim conheci-o porque em 1962 estive com a minha família na Baixa do Kassanje e convivi com um branco que estava visivelmente doente do ponto de vista emocional, por ter participado no sucedido. Divulgo o texto porque me parece essencial homenagear todos os que sofreram naqueles horríveis anos de 61 a 63 em Angola e todos os que participaram no 4 de Fevereiro de 1961, que em breve comemoraremos mais uma vez.
Jofre Justino)
O país voltou a recordar há dias o Massacre da Baixa de Kassanje, ocorridoa 4 de Janeiro de 1961, nessa região que fazia parte do antigo distrito de Malanje, quando mais de 20 mil angolanos foram abatidos por bombas de napalm lançadas por aviões da força aérea colonial, na sequência de uma revolta protagonizada por camponeses da zona, em reacção à exploração feroz de que eram vítimas nas plantações de algodão, um dos esteios do início da luta de libertação nacional que se viria a dar a 4 de Fevereiro daquele mesmo ano. Porém, ao contrário do que a história oficial regista, o massacre da Baixa de Kassanje teve uma espécie de «réplica» pouco tempo depois, já que as autoridades coloniais portuguesas voltaram a chacinar populações indefesas em grande escala no então distrito vizinho do Uíje, acontecimento do qual, incompreensivelmente, nunca se fez qualquer menção ao longo destes anos todos.
Segundo soube o Semanário Angolense de boa fonte, em alegada perseguição aos «terroristas» que sobreviveram a Kassanje, as tropas coloniais portuguesas chegaram ao Uíje, que por sinal já era um outro grande foco da estalada resistência armada ao regime fascista de Oliveira Salazar. Chegadas aqui, deram-se conta que a sua penetração estaria a ser dificultada por activistas locais dos movimentos de contestação ao poder colonial, que, segundo os depoimentos recolhidos por este jornal, eram sobretudo negros assimilados, «gente que já sabia ler e escrever», entre os quais constavam professores, enfermeiros e outros funcionários públicos. Com ajuda de padres católicos, as tropas coloniais portuguesas introduziram agentes seus entre a população uijense, para descobrirem quem eram estes tais «negros assimilados» que se estavam a opor aos seus intentos. Vai daí, urdiram uma cilada, da qual resultaria a morte de mais de 500 cidadãos angolanos negros, uns por via de bombardeamentos aéreos e outros à pancada e à baioneta por tropas de infantaria, naquilo que entre os sobreviventes ficou conhecido como o Massacre de Quimalundo. Aconteceu a 24 de Abril de 1961. A cilada consistiu no seguinte: as autoridades coloniais emitiram convocatórias às populações locais para uma reunião que teria lugar em Quimalundo, a 80 quilómetros a norte da cidade do Uíje, no agora município do Puri, a partir das 09 horas daquele dia, na qual se transmitiria o resultado de supostos acordos havidos entre representantes do «MPLA», que era o movimento de contestação que mais se falava então, e o governo ocupante, para se pôr um fim à crise política (e militar) que se instalara em várias regiões da colónia, em que já se falava de independência, coisas e tal. O local escolhido foi um descampado que servia para o pasto do gado. Para tranquilizarem as presas, as autoridades coloniais anunciaram que chegaria um avião com os ditos representantes do «MPLA». E com efeito, um avião foi visto a sobrevoar a área, o que levou os populares a caírem na conversa dos colonos de que lá estavam os esperados negociadores do «MPLA». Só que, afinal, era um avião de reconhecimento militar, queconfirmou a presença da enganada multidão, para o massacre planeado pelos colonos. Quando os populares se deram conta do logro, já um outro avião passava pela multidão a lançar bombas, dando início à carnificina.
Contam os sobreviventes que muitos que não caíram pela saraivada de bombas, acabaram por ser mortos à pancada e à baioneta por tropas de infantaria que já estavam próximas do local da «reunião» preparadaspara a chacina. Cerca de 500 pessoas foram barbaramenteassassinadas.Ao que se soube mais tarde,a operação havia sido arquitectada pela PIDE-DGS, a famigerada polícia política do regime fascista português de então. E os negros que se diz terem sido vistos no primeiro avião para servirem de isco eram colaboradores ou bufos ao seu serviço. Felizmente para a história, ainda há pessoas vivas com alguma ligação a este massacre, que podem fornecer subsídios mais precisos sobre ele, mas agrande inquietação dos populares que sabem deste episódiomacabro é que ele nunca foi lembrado ao longo destes anos todos, nem mesmo a nível provincial, como se nada se tivesse passado, o que é lamentável.
Domingos Adão, 46 anos, é filho de um então sobrevivente do massacre. Ele não entende as razões que estarão por detrás deste esquecimento algo criminoso de um episódio tão sangrento que devia figurar nos registos da repressão colonial que se abateu particularmente sobre os angolanos naquele tumultuoso ano de 1961. Ele garante que ainda há sobreviventes dessa chacina, alguns dos quais residem mesmo já em Luanda, bem como viúvas e outros órfãos, sobretudo na própria localidade onde se registou o massacre, isto é, em Quimalundo, município do Puri, província do Uíje. Segundo Domingos Adão, há um dado curioso a reter: as tropas coloniais que vieram exterminar os feridos que haviam escapado aos bombardeamentos não tocavam nas mulheres. Exactamente porquê, é que não se sabe. É serviço para os historiadores.
de um mail enviado por Joffre Justino
Pensar e Falar Angola
1 comentário:
Jotacê
Agradeço-lhe que vá até ao AngolaBela e leia o post "Blogs que ajudam a Blogar"
Um abraço
Belo
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