sábado, 4 de fevereiro de 2012

A propósito do 4 de Fevereiro resolvo divagar

Hoje Angola comemora o 51º aniversário do início da luta armada como o colonialismo. Há 51 anos atrás um grupo de rebeldes atacou a casa de reclusão de S, Paulo e uma esquadra de polícia, mais coisa menos coisa. Quem eram, donde vieram e quem os organizou, e outras estórias de bastidores continuam envoltos em polémicas. O 15 de Março e... e tantas outras datas anteriores poderiam ser o início da luta contra o colonialismo. Optou-se pelo 4 de Fevereiro e que seja.
Por isso lembrei-me de ir ler um pouco sobre um povo que me está próximo e que sempre manteve a sua independência, os seus hábitos e os seus costumes e ao colono respondeu sempre com desdém, ao que sei.
Ruy Duarte de Carvalho bem os conheceu e bem os descreveu. 
Vamos aos apontamentos perdidos e achados na internet.
Os Mucubais, povo guerreiro e pastor mantém um sentimento de pertença muito acentuado sobre o seu território, todo o deserto e savana do Namibe até ao sopé da Serra da Chela na Huíla, mantendo uma relação complicada com o povo Humbe que habita a Huíla. Esta limitação do território Mucubal é uma consequência da guerra de 39 em que os portugueses os derrotaram e quase os dizimaram, confinaram-nos ao deserto e savana abaixo da Serra da Chela. Os Mucubais nunca esqueceram esta derrota. 
Em 1975, com a invasão sulafricana, os Mucubais se juntaram ao MPLA, naquilo que 'julgaram' ser uma guerra de 'negros contra brancos' e impediram que estes chegassem à cidade do Namibe. Aqui começam nova guerra com os 'Mumuilas' (M'huilas), roubando-lhes o gado. 
Penso, não encontrei documentação, mas na oralidade da História que ouvi, a quando da formação do Exército Angolano alguns Mucubais foram incorporados mas recusaram permanecer nos quarteis e, verdadeiramente de armas e bagagem voltavam para as suas casas. Ou seja, mais uma vez mostraram a sua 'incapacidade' de se integrarem com outros 'povos'.
Ainda hoje os Mucubais se consideram os grandes donos de África porque são portadores  da arte, cultura e espírito africano.
Há cerca de dois anos, o soba do Virei, Inácio Masseca, com 85 anos realçava que a tribo Mucubal, constituída por povos cuja riqueza são os bois e que com seu vestuário, apresentando-se semi-nus, não dispensando a catana e o porrinho, são capazes de percorrerem 50 km por dia em busca de pastagens.  



 Retirado de Ruy Duarte de Carvalho:
Quando eclodiu a «guerra de libertação nacional», em 1961, ainda não tinham passado 20 anos desde que a «guerra dos Mucubais», movida pela administração e pela tropa portuguesas, por pouco não os ia dizimando. Foi a guerra do Kakombola, a guerra total, a última de uma regular sucessão de «rusgas» que durou cerca de 100 anos e não se interrompeu com a consumação da tranquilidade militar imposta a toda a colónia desde o princípio da terceira década do séc. XX, antes prevaleceu por mais duas décadas, constante, utilizando sempre tropa indígena enquadrada por figuras europeias ou europeízadas da cena colonial, administrativos, militares e civis, desde o tempo dos capitães-mores, em que tudo se confundia. A documentação publicada a que tenho recorrido informa que os capitães-mores de Quilengues, quando acharam que já não dava para raziar mais, ou só, os Tyilengue, se voltaram então para os Kuvale, a Sul, passando a usar aqueles como auxiliares a quem caberia uma parte do gado raziado. Razia implica contra-razia, ou comporta-a mesmo desde que a circulação de gado que assim se estabelece seja entendida como um dispositivo integrado nos e pelos sistemas pastoris. Assim, ao longo de 100 anos, de meados do séc. XIX a meados do séc. XX, manteve-se uma guerra que não foi só uma guerra entre Kuvale e Portugueses mas também, e muito insidiosamente, uma guerra entre os Kuvale e os seus imediatos vizinhos a Norte. 1941 vem pôr fim a essa continuidade. Mas deixará os Kuvale em muito má situação, uma grande parte sepultada em valas-comuns e outra grande parte deportada para São Tomé.



foto de Eric Lafforgue
Pensar e Falar Angola

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