sábado, 10 de novembro de 2018

Escola Secundária Njinga Mbande


Liceu Feminino (antigo Dona Guiomar de Lencastre)
Equipamentos e infraestruturas
O primeiro projeto do antigo Liceu Feminino D. Guiomar de Lencastre, atual Escola Secundária Njinga Mbande, data de 1954 e é da autoria de Lucínio Cruz. Dois anos mais tarde, o mesmo arquiteto desenha a versão final com a participação de Eurico Pinto Lopes.
O equipamento escolar localiza-se nas imediações da antiga Praça da Independência (atual Largo 1º de Maio), na antiga Avenida D. João II (atual avenida Ho Chin Minh). O projeto está estritamente relacionado com o plano de 1952 para Luanda, realizado por João Aguiar, onde são definidas as novas zonas de desenvolvimento da cidade, e surgem claramente identificadas as localizações da futura escola comercial e industrial e do novo liceu feminino. Ambos os equipamentos são exemplares na abordagem ao desenho da cidade proposto pelo Gabinete de Urbanização do Ultramar durante a segunda metade da década de 1950.
Com este projeto é estabelecido um padrão de atuação no espaço colonial no que concerne a edifícios escolares. Os lotes, livres de constrangimentos, permitem implantar edifícios isolados, naturalmente mais favoráveis à cultura de projeto que se aperfeiçoa dentro de uma lógica de uniformização das soluções encontradas. Configura-se aqui uma tendência para produzir um padrão arquitetónico apropriado ao maior número de unidades. É o início de um sistema que trata a disseminação destes equipamentos no território colonial como uma infraestrutura de desenvolvimento. Este facto clarifica-se com a definição das Normas para as Instalações dos Liceus e Escolas do Ensino Profissional nas Províncias Ultramarinas, redigidas em 1956 pelo arquiteto João Aguiar, à época diretor do GUU, com o engenheiro civil Eurico Gonçalves Machado, da Direcção Geral dos Serviços de Urbanização do Ministério de Obras Públicas em serviço no GUU, e com o arquitecto Fernando Schiappa de Campos. É já depois da implementação destas normas, que Eurico Pinto Lopes finaliza um projeto de liceu que irá contribuir para a fixação de uma tipologia.
O projeto inicial de Lucínio Cruz, apresentado em 1954, baseava-se num grande corpo em forma de “U”, com 3 pisos ligados por duas amplas escadarias. As salas de aulas e laboratórios uniam-se aos ginásios que serviam simultaneamente de recreios cobertos, com instalações sanitárias anexas. Ao programa juntava-se um corpo independente do conjunto de ensino, destinado ao Salão de Festas, que se ligaria através de uma ampla galeria com comunicação pelo átrio principal.
Na versão final, o traçado do liceu estrutura-se a partir de um eixo de simetria axial, muito apropriado à duplicação de serviços quando se tratam de diferentes níveis de ensino ou de escolas mistas instalados no mesmo bloco (caso da escola do Huambo). Organiza-se em torno de dois pátios e recorre a galerias de distribuição que também asseguram a proteção solar das fachadas ou o abrigo em caso de forte pluviosidade. Esta abordagem tenderá, noutros projectos, a ser substituída por configurações mais dinâmicas, apoiadas em organizações lineares de génese em “H”. No entanto, as combinações são sempre estruturadas a partir da utilização em galeria de distribuição.
No piso térreo, o programa original distribui, ao longo dos dois blocos longitudinais, os serviços administrativos e de direção, além de outras dependências como a biblioteca e a sala de professores; entre os dois pátios situam-se o auditório, e nos blocos laterais encontram-se os ginásios e respetivos vestiários. No piso superior, as salas de aula distribuem-se ao longo do bloco principal, com as salas de desenho e trabalhos manuais na zona posterior. O segundo piso segue a mesma lógica para as salas de aulas, os laboratórios sobrepõem-se à zona das salas de trabalhos manuais do piso inferior. No bloco central é integrada uma capela.
A fachada principal apresenta uma composição simétrica, com a monumentalização da entrada através da simulação de um pórtico que abrange os três pisos formados por uma sucessão de galerias sobrepostas e abertas sobre a paisagem urbana da cidade. A leitura da memória descritiva é pouco elucidativa quanto a opções estéticas, refletindo, sobretudo, uma cultura de projeto onde se procura “que o desenvolvimento [dos alçados] não só correspondesse às exigências funcionais da planta como também às outras que derivam fundamentalmente das condições sociais”.
O estabelecer de um modus operandi agiliza os processos em projectos similares posteriores. As peças escritas são uniformizadas e o desempenho arquitetónico aproxima-se da estandardização. Soluções-tipo, detalhamento, materiais que integram um painel normalizado com aplicação a todos os equipamentos escolares denunciam uma produção em série.  Este tipo de enunciado, presente no Liceu D. Guiomar de Lencastre, é recorrente nas memórias descritivas dos outros projetos, evidenciando os aspetos “racionais” da composição em detrimento dos estéticos.
O novo liceu da capital angolana para uma capacidade de 720 alunas, inaugura assim uma série de projetos semelhantes que se disseminam pelos diversos territórios coloniais. Em Angola foi reproduzido em Benguela, no Huambo (antigo Liceu Norton de Matos) e em Moçâmedes, apesar deste último não ter sido terminado, e em Moçambique existem liceus semelhantes em Maputo (antigo Liceu António Enes) e na Beira (antigo Liceu Pêro Anaia).
Em 2009 a escola encontrava-se num estado muito próximo do original e em pleno uso.

Ana Vaz Milheiro


Pensar e Falar Angola

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