domingo, 25 de abril de 2010

Ágora (113) - O Golo




De vez em quando, tenho fases de misantropia assumida. Nessas alturas, faço sempre coisas diferentes, e tanto quanto possível em locais irrepetíveis. Há um denominador comum nesta fase, para além da irascibilidade, que é a de não dispensar a releitura dos Cantos de Maldoror, obra “que nos ensina a voar sobre o abismo”, do Conde de Lautremont, um francês de nome Isidore Ducasse, nascido no Uruguai em 1846, e falecido em Paris em 1870.
Tenho sentido uma inquietude incomum, que será passageira, e nesses momentos para não vasculhar as ideias, vou desarrumar armários, baús e estantes onde possa encontrar algo de tangível que me faça sair de períodos de torpor prolongados.
Reencontrei nas minhas buscas, uns exemplares da “Revista Golo”, que em Novembro de 1987, representou o primeiro esforço de se fazer uma publicação graficamente apelativa, simultaneamente informativa e com objectivos formativos interessantes sobre a cultura física e o desporto em Angola.
Superiormente dirigida por Gustavo Costa, que me substitui melhoradamente, enquanto director do CNDI da então Secretaria de Estado dos Desportos, dos tempos entusiasmantes do Ruy Mingas, a “Golo” tornou-se o primeiro elo editorial da lusofonia, no plano da educação física e desportos.
A revista era excelente, com o malogrado Alexandre Gourgel, Luís Costa e Miguel Correia Filho na redacção, Miguel Magalhães e Carlos Lousada na fotografia. Dos colaboradores permanentes, o saudoso Matos Fernandes, Paulo Murias, Helder Moura, Arlindo Macedo, Aguiar dos Santos, Américo Gonçalves, Severino Carlos, Raquel Grácio, João Madeira , Graça Campos e eu próprio.
Colaboradores “internacionais” era o Luís Fernando em Cuba, o saudoso amigo e enorme jornalista português Carlos Pinhão, o prof. António Sousa Santos, o prof. Manuel Sérgio e a extraordinária professora brasileira Drª Maria Licia Marques, que foi a minha companhia quase permanente, quando eu debutava no Congresso da IASI, nessa circunstância em Bucareste em 1981.
Vou provavelmente em futuras crónicas, tentar mostrar o que foi o dealbar do desporto angolano no período que se seguiu à independência, e as razões que permitiram que o basquetebol e o andebol, tenham sido campeões crónicos em campeonatos africanos, e com participações meritórias nos campeonatos do mundo e jogos olímpicos.
Resumidamente, o que se pode dizer é que a opção por estas modalidades corporizada pelo Ruy Mingas, e partilhada por todos os quadros superiores e responsáveis da SEEFD de então, deu os resultados esperados, apesar de haver tentativas, que nalguns casos tiveram protagonismos soes, na defesa do “colocar tudo no cesto do futebol”.
Só o facto de haver uma política desportiva definida, alicerçada num projecto político em que a cultura física e o desporto fossem determinantes na educação do jovem, e simultaneamente que servissem para a afirmação de Angola como nação num contexto internacional, ao tempo adverso, em relação à nada Republica Popular de Angola, permitiu que ainda hoje se prolongue com êxito o trabalho então encetado e tantas vezes vilipendiado.
Voltarei a este tema, e foi bom estar assim como que emocionalmente fragilizado, para ler “o Golo” que se metia de três em três meses, nesses anos oitenta de tanta ausência e simultaneamente de tanto empenho.
Já agora, o “Golo” nada tem a ver com os “Cantos de Maldoror”, indispensável livro de cabeceira de há trinta anos a esta parte.

Fernando Pereira
28/2/2010


Pensar e Falar Angola

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