terça-feira, 30 de junho de 2020
sexta-feira, 26 de junho de 2020
De "A província de Angola" a "Jornal de Angola"
Uma adaptação rápida às novas adversidades
Filomeno Manaças
Esta velha casa de Imprensa, que tantos bons profissionais já produziu e de que nos orgulhamos, alguns dos quais serviram e continuam ainda hoje a servir com galhardia outras instituições, desde públicas a privadas, passando por jornais, ministérios, embaixadas, organizações internacionais, etc., cumpre neste dia mais um aniversário de vida - o 44º -, com os jornalistas e demais pessoal indispensável à feitura de jornais imbuídos da certeza de que se continua a fazer história.
Foi a 26 de Junho do ano de 1976 que o então Presidente Agostinho Neto assinou o decreto 51/76, que determinava o confisco da então Empresa Gráfica de Angola - SARL e abria as portas para a criação da Edições Novembro, primeiro UEE (Unidade Económica Estatal) e, mais tarde, Empresa Pública. Já antes, no calor das transformações políticas que o país então vivenciava, em 1975, e fazendo jus ao desejo de emancipação que fervilhava de Cabinda ao Cunene e do mar ao Leste, o único jornal que esta casa de imprensa produzia despia-se do título “A Província de Angola” e passava a designar-se, a partir de 1 de Julho desse ano, Jornal de Angola.
De lá para cá, foi o trilhar de um percurso, com altos e baixos, que transformou a Edições Novembro - EP numa das principais empresas gráficas do país e o Jornal de Angola no principal diário do país.
Escola de profissionais das mais diversas áreas do saber que concorrem para a produção dos diferentes títulos da empresa - desde o jornalismo ao sector das artes gráficas, passando pela publicidade e área administrativa, em que não se pode esquecer as finanças e, nesse quesito, a contabilidade, além naturalmente da gestão dos recursos humanos -, a Edições Novembro continua focada em acompanhar as transformações que o mundo da imprensa está a sofrer, agora de forma particularmente acentuada com o advento da pandemia da Covid-19.
Trabalhar em ambiente de tempestade - assim se pode caracterizar o momento actual, pautado pela vaga de ataques do novo coronavírus, que está a semear apreensões e incertezas em todo o mundo e a pôr em causa as previsões mais optimistas, como que a alertar que nestes tempos elas têm pouco ou nenhum valor - está a ser um aprendizado que, desde logo, nos mostrou a necessidade de potenciar a aposta nas plataformas digitais.
Por força das restrições a que o mundo esteve e continua obrigado a observar, a Internet passou a ocupar maior espaço nas nossas vidas, tal como o acesso ao audiovisual, para o consumo de informação relevante sobre a evolução da Covid-19 no mundo e outros acontecimentos que vão tendo lugar.
Digamos que a pandemia veio reforçar a importância da Internet e dos smartphones, tratando de pôr em relevo toda a diferença que fazem num tal contexto. Recursos sem os quais muita coisa poderia estar a acontecer no mundo e simplesmente ser abafada, porque teria escapado ao conhecimento e sufrágio da aldeia global que hoje somos.
Recuando no tempo, é possível imaginar o cortejo de horrores que terá acontecido à pala da gripe espanhola, que varreu o mundo entre 1918 e 1920, e que ficaram por ser contados.
A rápida adaptação, feita pela empresa e pelos jornalistas, ao novo contexto, permitiu esbater os efeitos negativos da Covid-19 e continuar a manter, nestes tempos conturbados, a Edições Novembro e o Jornal de Angola como empresas de referência na produção de conteúdos informativos, vincando o profissionalismo e o empenho dos quadros em manter o público sempre ao corrente das principais novidades políticas, económicas, culturais e sociais, quer em relação aos acontecimentos no âmbito doméstico, quer a nível mundial.
Vindo dos tempos em que o jornal físico era o rei todo - poderoso - e até hoje não troco o prazer de folheá-lo e de poder fazer anotações à lápis ou lapiseira aos textos - foi com um aperto no coração que olhei para o vendaval que a pandemia de Covid-19 anunciava, como a possibilidade de o vírus poder ser transmitido de uma para outra pessoa até mesmo através de documentos.
E o jornal físico - tenho defendido -, é um documento diferente do documento virtual. Tem mesmo vantagens incomparáveis, como a possibilidade de o que for postado num site ser susceptível de alteração, de ser retirado ou apagado, ao contrário do que for escrito em papel de jornal. Fica lá e não sai! Se estiver errado, há sempre a possibilidade de ser rectificado/corrigido nas edições seguintes ou posteriores e, se não o fizer, há ainda o instituto do direito de resposta. Isto obriga o jornalista a um maior cuidado no apuramento dos factos, nestes tempos em que as fake news também disputam as atenções do público, pretendendo impôr-se como verdades, e uns quantos teimam em querer confundir o jornalismo com qualquer informação produzida e postada nas redes sociais.
Quem me estiver a ler pode pensar que sou contra as redes sociais. Desengane-se! Sou partidário de que a empresa deve abraçar os dois modelos de negócio: os jornais nas plataformas digitais e os jornais físicos. Acredito que há uma grande margem de progressão dos jornais impressos ainda não explorada convenientemente, tal como é verdade que temos uma grande avenida a percorrer em matéria de qualidade gráfica e editorial dos produtos digitais, que são uma ferramenta que permite chegar a um público mais vasto, que as publicações físicas, pelas especificidades que lhe são inerentes, não conseguem alcançar.
Conhecedores desta realidade, eis-nos aqui prontos a desbravar novos caminhos, com a mesma firmeza de sempre. Para todos os profissionais desta casa de imprensa, aos que partiram e aos que, de forma abnegada, continuam a dar o seu melhor em prol da empresa, hoje é um dia de merecido tributo.
in Jornal de AngolaDe lá para cá, foi o trilhar de um percurso, com altos e baixos, que transformou a Edições Novembro - EP numa das principais empresas gráficas do país e o Jornal de Angola no principal diário do país.
Escola de profissionais das mais diversas áreas do saber que concorrem para a produção dos diferentes títulos da empresa - desde o jornalismo ao sector das artes gráficas, passando pela publicidade e área administrativa, em que não se pode esquecer as finanças e, nesse quesito, a contabilidade, além naturalmente da gestão dos recursos humanos -, a Edições Novembro continua focada em acompanhar as transformações que o mundo da imprensa está a sofrer, agora de forma particularmente acentuada com o advento da pandemia da Covid-19.
Trabalhar em ambiente de tempestade - assim se pode caracterizar o momento actual, pautado pela vaga de ataques do novo coronavírus, que está a semear apreensões e incertezas em todo o mundo e a pôr em causa as previsões mais optimistas, como que a alertar que nestes tempos elas têm pouco ou nenhum valor - está a ser um aprendizado que, desde logo, nos mostrou a necessidade de potenciar a aposta nas plataformas digitais.
Por força das restrições a que o mundo esteve e continua obrigado a observar, a Internet passou a ocupar maior espaço nas nossas vidas, tal como o acesso ao audiovisual, para o consumo de informação relevante sobre a evolução da Covid-19 no mundo e outros acontecimentos que vão tendo lugar.
Digamos que a pandemia veio reforçar a importância da Internet e dos smartphones, tratando de pôr em relevo toda a diferença que fazem num tal contexto. Recursos sem os quais muita coisa poderia estar a acontecer no mundo e simplesmente ser abafada, porque teria escapado ao conhecimento e sufrágio da aldeia global que hoje somos.
Recuando no tempo, é possível imaginar o cortejo de horrores que terá acontecido à pala da gripe espanhola, que varreu o mundo entre 1918 e 1920, e que ficaram por ser contados.
A rápida adaptação, feita pela empresa e pelos jornalistas, ao novo contexto, permitiu esbater os efeitos negativos da Covid-19 e continuar a manter, nestes tempos conturbados, a Edições Novembro e o Jornal de Angola como empresas de referência na produção de conteúdos informativos, vincando o profissionalismo e o empenho dos quadros em manter o público sempre ao corrente das principais novidades políticas, económicas, culturais e sociais, quer em relação aos acontecimentos no âmbito doméstico, quer a nível mundial.
Vindo dos tempos em que o jornal físico era o rei todo - poderoso - e até hoje não troco o prazer de folheá-lo e de poder fazer anotações à lápis ou lapiseira aos textos - foi com um aperto no coração que olhei para o vendaval que a pandemia de Covid-19 anunciava, como a possibilidade de o vírus poder ser transmitido de uma para outra pessoa até mesmo através de documentos.
E o jornal físico - tenho defendido -, é um documento diferente do documento virtual. Tem mesmo vantagens incomparáveis, como a possibilidade de o que for postado num site ser susceptível de alteração, de ser retirado ou apagado, ao contrário do que for escrito em papel de jornal. Fica lá e não sai! Se estiver errado, há sempre a possibilidade de ser rectificado/corrigido nas edições seguintes ou posteriores e, se não o fizer, há ainda o instituto do direito de resposta. Isto obriga o jornalista a um maior cuidado no apuramento dos factos, nestes tempos em que as fake news também disputam as atenções do público, pretendendo impôr-se como verdades, e uns quantos teimam em querer confundir o jornalismo com qualquer informação produzida e postada nas redes sociais.
Quem me estiver a ler pode pensar que sou contra as redes sociais. Desengane-se! Sou partidário de que a empresa deve abraçar os dois modelos de negócio: os jornais nas plataformas digitais e os jornais físicos. Acredito que há uma grande margem de progressão dos jornais impressos ainda não explorada convenientemente, tal como é verdade que temos uma grande avenida a percorrer em matéria de qualidade gráfica e editorial dos produtos digitais, que são uma ferramenta que permite chegar a um público mais vasto, que as publicações físicas, pelas especificidades que lhe são inerentes, não conseguem alcançar.
Conhecedores desta realidade, eis-nos aqui prontos a desbravar novos caminhos, com a mesma firmeza de sempre. Para todos os profissionais desta casa de imprensa, aos que partiram e aos que, de forma abnegada, continuam a dar o seu melhor em prol da empresa, hoje é um dia de merecido tributo.
Pensar e Falar Angola
quinta-feira, 25 de junho de 2020
Livros Ultramar - Guerra Colonial: Angola & Descolonização (FNLA) - Jornal 'LIBERDADE...
Livros Ultramar - Guerra Colonial: Angola & Descolonização (FNLA) - Jornal 'LIBERDADE...: Angola & Descolonização (FNLA) - O primeiro número do órgão de informação da organização liderada por Holden Roberto, editado em ter...
Sanzalando
Sanzalando
quarta-feira, 24 de junho de 2020
João Melo, irreverente e livre
João Melo, irreverente e livre
Adriano Mixinge
Para mim, ele começou sendo apenas um poeta mais. Soube que existia, em finais dos anos 80: os seus primeiros seis livros são de poesia, tendo o primeiro deles, “Definição”, sido publicado em 1985.
Mas, foi “Fabulema”, o livro que publicou no ano seguinte, o que me chegou às mãos, na “Ciudad Libertad”: o livro estava entre vários outros na caixa de livros, que, em 1990, a minha irmã São me ofertou quando eu ainda vivia naquela cidade universitária, no bairro de Marianao, em Havana.
Para ser sincero, na altura, dei pouca ou nenhuma importância àquele livro de João Melo (Luanda, 1955). Depois de tudo, - creio ter pensado na época -, no nosso país, os poetas surgiam e proliferavam como cogumelos depois da chuva, para além de que, como sabemos, apesar do muito que se publica em poesia, escasseiam os bons livros deste género literário: eu sempre tive ( e continuo a ter) dificuldades em encaixar o João Melo, entre os poetas da geração 80 e ainda bem.
Porém, apesar do escritor ter publicado “Limites & Redundâncias” (1997), quando eu já tinha regressado à Angola e vivia, em Luanda, foi com “Imitação de Sartre & Simone de Beauvoir” (1998) que eu desfrutei, fartei-me de rir e descobri o escritor livre, sem tabús e irreverente que ele é: a ideia do escritor insosso, asfixiado na sua própria gravata, sério, que nunca foi boémio e bon vivant como eu imaginava - talvez, com pouco tino-, que tinham sido os “escritores revolucionários” dos anos 60 e 70 esvaiu-se, completamente, quando eu li o primeiro livro de contos de João Melo, foi uma autêntica revelação.
Falando sobre a obra do escritor, o ensaísta Pires Laranjeira, professor da Universidade de Coimbra (Portugal) afirma que: “é imperdoável o desconhecimento de uma obra contística única nos cinco países africanos de língua portugesa, que não busca o efeito castiço de origem étnico-pop, nem o delicodoce das ternurentas aventuras infanto-juvenis ou das estórias piadéticas para entreter turistas, que merecem o seu lugar”.
Apesar de ter escrito e continuar a escrever poesia, o conto é o género literário em que João Melo se exprime e se espraia com maior acutilância, com muita piada, com um humor por vezes corrosivo e com absoluta liberdade: quem quiser compreender as subtilezas, os acertos e desacertos de parte significativa da sociedade angolana actual deve ler, atentamente, os livros de contos do escritor.
João Melo é um dos escritores que melhor soube navegar dentro do sistema político, social e económico que se instalou, em Angola, nos últimos trinta e cinco anos, adoptando diferentes perfis sócio-profissionais, mas, em todos eles, e à sua maneira, empurrando as barreiras do conservadorismo, ajudando a consumar transformações positivas dentro do próprio sistema: jornalista, publicitário, professor universitário, consultor e político.
“O dia em que Charles Bossangwa chegou à América” é o seu mais recente livro, que reúne contos escritos entre 2017 e 2019. Editado pela editorial Caminho, com prefácio de Maria Teresa Salgado da Universidade Federal de Rio de Janeiro (Brasil), este livro de contos de João Melo traz sete contos, nomeadamente, “O país está desgovernado”, “Uma pequena saga ministerial”, “o perigo amarelo”, “Uma mulher séria”, “O torcicolo”, “O angolano que não gostava do verbo malhar” e “O dia em que Charles Bossangwa chegou à América”.
Longe da ideia e da atitude de intelectual eremita e solitário, apático e indiferente ao seu tempo e às suas circunstâncias, João Melo é um cidadão que fez-nos ouvir sempre a sua voz – a troca de galhardetes com o actual embaixador do Brasil em Angola foi uma consequência das posturas e ideias que bem defende - e não tem receio nem tabú nenhum em abordar temas escabrosos, - já sejam eles temas sociais, políticos e ou sexuais-, falar sobre os problemas e as inquietações do homem, em todas as suas facetas existenciais.
“Mestre do conto”, no dizer da professora Maria Teresa Salgado da Universidade Federal de Rio de Janeiro (Brasil), João Melo é, sobretudo, um escritor irreverente, útil, livre e à ler, permanentemente.
Ele é o contista que não devemos ignorar.
in Jornal de AngolaPara ser sincero, na altura, dei pouca ou nenhuma importância àquele livro de João Melo (Luanda, 1955). Depois de tudo, - creio ter pensado na época -, no nosso país, os poetas surgiam e proliferavam como cogumelos depois da chuva, para além de que, como sabemos, apesar do muito que se publica em poesia, escasseiam os bons livros deste género literário: eu sempre tive ( e continuo a ter) dificuldades em encaixar o João Melo, entre os poetas da geração 80 e ainda bem.
Porém, apesar do escritor ter publicado “Limites & Redundâncias” (1997), quando eu já tinha regressado à Angola e vivia, em Luanda, foi com “Imitação de Sartre & Simone de Beauvoir” (1998) que eu desfrutei, fartei-me de rir e descobri o escritor livre, sem tabús e irreverente que ele é: a ideia do escritor insosso, asfixiado na sua própria gravata, sério, que nunca foi boémio e bon vivant como eu imaginava - talvez, com pouco tino-, que tinham sido os “escritores revolucionários” dos anos 60 e 70 esvaiu-se, completamente, quando eu li o primeiro livro de contos de João Melo, foi uma autêntica revelação.
Falando sobre a obra do escritor, o ensaísta Pires Laranjeira, professor da Universidade de Coimbra (Portugal) afirma que: “é imperdoável o desconhecimento de uma obra contística única nos cinco países africanos de língua portugesa, que não busca o efeito castiço de origem étnico-pop, nem o delicodoce das ternurentas aventuras infanto-juvenis ou das estórias piadéticas para entreter turistas, que merecem o seu lugar”.
Apesar de ter escrito e continuar a escrever poesia, o conto é o género literário em que João Melo se exprime e se espraia com maior acutilância, com muita piada, com um humor por vezes corrosivo e com absoluta liberdade: quem quiser compreender as subtilezas, os acertos e desacertos de parte significativa da sociedade angolana actual deve ler, atentamente, os livros de contos do escritor.
João Melo é um dos escritores que melhor soube navegar dentro do sistema político, social e económico que se instalou, em Angola, nos últimos trinta e cinco anos, adoptando diferentes perfis sócio-profissionais, mas, em todos eles, e à sua maneira, empurrando as barreiras do conservadorismo, ajudando a consumar transformações positivas dentro do próprio sistema: jornalista, publicitário, professor universitário, consultor e político.
“O dia em que Charles Bossangwa chegou à América” é o seu mais recente livro, que reúne contos escritos entre 2017 e 2019. Editado pela editorial Caminho, com prefácio de Maria Teresa Salgado da Universidade Federal de Rio de Janeiro (Brasil), este livro de contos de João Melo traz sete contos, nomeadamente, “O país está desgovernado”, “Uma pequena saga ministerial”, “o perigo amarelo”, “Uma mulher séria”, “O torcicolo”, “O angolano que não gostava do verbo malhar” e “O dia em que Charles Bossangwa chegou à América”.
Longe da ideia e da atitude de intelectual eremita e solitário, apático e indiferente ao seu tempo e às suas circunstâncias, João Melo é um cidadão que fez-nos ouvir sempre a sua voz – a troca de galhardetes com o actual embaixador do Brasil em Angola foi uma consequência das posturas e ideias que bem defende - e não tem receio nem tabú nenhum em abordar temas escabrosos, - já sejam eles temas sociais, políticos e ou sexuais-, falar sobre os problemas e as inquietações do homem, em todas as suas facetas existenciais.
“Mestre do conto”, no dizer da professora Maria Teresa Salgado da Universidade Federal de Rio de Janeiro (Brasil), João Melo é, sobretudo, um escritor irreverente, útil, livre e à ler, permanentemente.
Ele é o contista que não devemos ignorar.
23-06-2020
Pensar e Falar Angola
terça-feira, 23 de junho de 2020
sexta-feira, 19 de junho de 2020
Dr. Marcolino Moco - A mesa do café
Interessados na História do Direito e da Justiça ou mesmo no âmbito mais largo da História Universal, já ouviram falar, certamente, do caso Dreyfus, que decorreu entre os anos de 1894 a 1904, em França.
Telegraficamente, para quem nunca ouvio falar:
No cesto de papéis do adido militar da Embaixada alemã, em França, é descoberto, por uma empregada francesa, um documento suspeito de resultar de uma acção de espionagem contra o país. De forma quase aleatória, aliás, sob um critério no mínimo eivado de anti-semitismo, é atribuída responsabilidade de tal actividade espiã, a um oficial francês de origem hebraica que funcionava num dos mais altos escalões da Forças Armadas, de seu nome Alfred Dreyfus.
Do coro de vozes daqueles que, em circunstância semelhantes, apresentam-se sempre como os mais autênticos guardiões do patriotismo e dos valores mais sublimes do país e pela aparente necessidade de a “culpa nunca dever morrer solteira”, à formalização judicial duma acusação gratuita, não foram muitos passos. Resultado: Dreyfus foi condenado ao degredo militar e prisão perpétua para uma ilha, ironicamente, chamada do Diabo. O homem só se livraria dessa situação (que deve ter inspirado o escritor Franz Kafka na concepção do seu, mundialmente, conhecido romance “O processo”) anos depois, por reacções persistentes da sociedade, ante evidencias tão claras de que Dreyfus não estava de forma alguma ligado àquele documento, nem à qualquer outro acto de espionagem, a favor da Alemanha.
Tenho razões para esperar que esta comparação, entre um caso de justiça francesa, ancorada no foro militar, de finais do século XIX e princípios do XX, com o nosso caso Tomás/CNC (mesmo que por maioria de razão, este último mais escandaloso que o primeiro, se tivermos em conta que corre no século XXI e no foro civil de uma república em plena “nova era”) vai ser apodada, por alguns, como despropositada. E lá me cairá em cima mais uma saraivada de insultos e insinuações. Não se confunda, essa referência, com opiniões diferentes da minha, quer sejam de carácter técnico-jurídico (que vários juristas têm levantado porque tão fáceis de constatar) quer de outro tipo de avaliação.
Eu sou “forçado” a regressar a este caso (que, entre outros, abordei, apenas a título exemplificativo, em sede de uma tese de carácter mais geral, já consagrada em livro) numa altura em que tenho evitado intervenções mais assíduas, para contornar uma conotação promovida de que eu esteja a ser um factor de estorvo aos esforços da nova direcção do país, cuja emergência saudei, por nos ter dado sinais iniciais relativamente positivos. É que no âmbito de mais uma oportunidade para a Justiça angolana puder emendar um soneto marcado por uma crueldade inaudita e, sobretudo, por um tratamento claramente desigual, não só a Augusto Tomás mas a todos os elementos do CNC (que, aparentemente, só estão ali porque o destino cruel os ligou ao antigo Ministro dos Transportes) se começa pressentir um “déjá vu” de informações e contra-informações. Até, pasme-se, nessas informações e contra-informações, coloca-se em causa o engajamento de uma advogada, na defesa do seu próprio constituinte. Como se não fosse de lei fazê-lo. Já para não falar de uma estranha notícia (boato-desejo?) que refere eventual jubilado compulsivo do actual Presidente do Tribunal Constitucional. Já para não referir também, quiçá de mesmas estranhas fontes, a indução em erro que ocorreu em tempos, de que Tomás teria sido libertado, causando equivocado mal-estar em sectores da população que acredita, piamente, que o caso CNC/Augusto Tomás se enquadra no âmbito de um processo justo, em sede do combate cerrado à corrupção.
Será que a nossa Justiça quer que este caso de injustiça tão evidente termine assim mesmo? E, sobretudo, será que essa crueldade (“in dubio contra reo”) se repetirá contra todos aqueles que se encontraram (se encontram) em situações semelhantes ou mais graves? Não vou aqui enumerar tais casos, alguns dos quais estão a correr no foro judicial, com rítmos claramente diferentes (reconhecido pelo PR) e relativamente mais consentâneos com os ditames legais. Será da pressão dessas fontes de informação e contra-informação? O que significaria que na área da justiça, neste país que parece ter galgado algumas distâncias positivas na área da liberdade de expressão e da comunicação social, continuaremos a ter casos Rafael Marques, William Tonet, Miala, 15+2, entre outros? Para tudo parecer igual à “justiça” dos últimos anos do consulado de José Eduardo dos Santos, só faltará a organização de algumas manifestações do partido no poder ou de algumas associações clamando: “nós somos milhões e contra milhões ninguém combate e quem combater será vencido; deixem a justiça fazer o seu trabalho”. Mais do que frustrante isso é para mim extremamente angustiante.
Como seria interessante que jornalistas de investigação tentassem esclerecer se se trata do regresso do “Sr Ordens Superiores” (rejeitado pelo actual PR), de simulação intimidatória consentida por algumas das próprias vítimas ou apenas antigos hábitos para tentar agradar os centros do poder, por tão ilustres dignitários do poder que nos deve julgar!?
Aberta está a discussão. Permito-me até que poderia ser um dos temas a ser tratado pela comissão recentemente criada pelo Presidente da República, para a Reforma da Justiça, que mais do que ocupar-se de estruturas e formalidades normativas, devia antes cuidar daquilo que, na minha opinião, mais tem corroído a nossa sociedade: atitudes lamentáveis dos nossos operadores políticos e judiciais, sempre afoitos em exibir a ideia do “agora é a nossa vez”. E não se diga, à partida, que se deve olhar para este caso como apenas um entre muitos. Pela sua visibilidade e acinte este é um caso paradigmático. Quem maltrata uma árvore, logo ali à beira do próprio quintal, não garante que nos venha a tratar bem da floresta. Falo da Justiça e do Direito e do seu papel para consolidar as transformações positivas que pareciam estar a ter lugar.
--
"Marcolino José C. Moco - Advogado/Consultor/Docente Universitário/Conferencista
Marcolino Moco & Advogados - Ao serviço da Justiça e do Direito
Marcolino Moco International Consulting - Um parceiro para o seu sucesso! Cuidamos de si e dos seus negócios!
www.marcolinomoco.com
Pensar e Falar Angola
terça-feira, 2 de junho de 2020
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