terça-feira, 9 de abril de 2013

CDC Angola luta por sistema de ensino artístico em dança - Entrevista


Contando com duas décadas de história e muito trabalho, a Companhia de Dança Contemporânea de Angola foi fundada pela sua actual directora Ana Clara Guerra Marques. Criada com o propósito de divulgar a dança contemporânea dentro e fora de Angola, a companhia tem apresentado de forma regular espectáculos. No entanto, Ana Clara Marques lamenta a inexistência de espaços, meios e equipamentos adequados, em Angola, para a apresentação dos seus trabalhos. Os apoios financeiros são também parcos. A qualidade do trabalho da CDC Angola é reconhecida além-fronteiras e as solicitações para actuar no estrangeiro continuam a surgir.
Em entrevista ao VerAngola, a bailarina e coreógrafa recorda a história da companhia, os trabalhos realizados, as expectativas, os anseios e as dificuldades passadas para manter a dança contemporânea viva em Angola.

A Companhia de Dança Contemporânea de Angola é a única companhia profissional de dança no País. Quando surgiu e qual tem sido o seu percurso?

A Companhia de Dança Contemporânea de Angola (CDC Angola) surge na continuidade de um longo processo com início nos anos 80, enquanto eu era directora da Escola de Dança. A ideia era formar um grupo experimental, com os alunos mais adiantados da Escola para que o público, a sociedade, pudesse perceber quer os propósitos de uma escola de formação em dança, quer uma outra vertente da dança, a vertente artística. Todavia, todas as propostas que, insistentemente, enviei à consideração superior durante cerca de 10 anos foram negadas até ao ano de 1991. Nesta altura com a Irene Guerra Marques, como directora da Direcção Nacional de Formação Artística e Cultural, e com a Ana Maria de Oliveira, como Ministra da Cultura, o projecto foi, finalmente, aceite e fundámos o Conjunto Experimental de Dança (CED). Com o CED tivemos uma série de apresentações e introduzimos novas estéticas e novas formas de espectáculo como, por exemplo, a utilização de espaços não convencionais. Em 1993 foi aprovada, oficialmente, por despacho do Ministério da Cultura, a passagem de conjunto experimental para Companhia de Dança Contemporânea, com a qual desenvolvemos todo um trabalho pioneiro de sensibilização e desenvolvimento da dança enquanto linguagem artística.

Quem são os fundadores da CDC Angola?

Comigo, foram membros co-fundadores do CED (posteriormente CDC), em 1991, a Vanda Nascimento (professora da Escola e bailarina), o Waldemar Tadeu Bastos (aluno avançado da Escola e bailarino), o João Paulo Costa (aluno avançado da Escola e bailarino) e o Rui Tavares (fotógrafo da CDC Angola).

Com que objectivos foi criada a CDC Angola?

O principal objectivo era, e continua sendo, divulgar e promover a dança contemporânea em Angola através da experimentação e da criação de autor, à procura de diferentes linguagens e vocabulários para a dança angolana. A este, está sempre subjacente a intenção de despertar a sensibilidade da sociedade e de educar o gosto do público, incentivando as pessoas à apreciação estética e estimulando a sua opinião crítica, através de espectáculos, projectos pedagógicos, projectos artísticos de âmbito social, seminários, oficinas e aulas regulares dirigidos aos diversos tipos de público (profissionais ou amadores, adultos ou crianças).
A Dança Inclusiva foi entretanto, por nós, introduzida em Angola, sendo hoje um dos nossos focos importantes a demonstração da possibilidade de integração de indivíduos portadores de deficiências físicas e outras na qualidade de bailarinos.

Qual foi o primeiro espectáculo apresentado pela CDC Angola?

O primeiro espectáculo que a CDC, ainda CED, apresentou intitulava-se “A Propósito de Lweji”. Teve lugar no dia 27 de Dezembro de 1991, no Teatro Avenida que, entretanto, foi derrubado. Tratava-se uma peça que marcou também o encerramento da Escola de Dança por falta de condições de funcionamento. A sua principal inspiração foi o mito da fundação do império Lunda e a escultura cokwe. Mas a primeira peça original criada foi “Mea Culpa” na qual se discutiam alguns tabus relacionados com a Igreja.

Ao longo dos anos, que espectáculos apresentou já a CDC Angola?

Já vai sendo longa a lista de trabalhos originais criados pela Companhia, bem como as suas apresentações. Mais de uma centena de espectáculos foram já apresentados com trabalhos como “A Propósito de Lweji” (1991), “Corpusnágua” (1992), “Mea Culpa” (1992), “Solidão” (1992), “1 Morto e os Vivos” (1992), “5 Estátuas para Masongi” (1993), “Imagem e Movimento” (1993), “Palmas, Por Favor!” (1994), “Os Címbalos dos Mudos” (1994), “Uma Frase Qualquer” (1994), “Introversão Versus Extroversão” (1995), “Neste País - Se não fosse a guerra...éramos todos (a) normais e 4 para 5” (1996), “Uma Frase Qualquer...e Outras (Frases)” (1997), “Os Quadros do Verso Vetusto” (1999), “Oratura… dos Ogros… e do Fantástico” (2008), “Peças para uma Sombra iniciada e outros Rituais mais ou Menos” (2009), “O Homem que chorava sumo de Tomates” (2011) e “Paisagens Propícias” (2012 / 2013).


Em que países actuou a Companhia?

A CDC Angola apresentou-se já em 11 países e 23 cidades, designadamente Angola (Luanda, Benguela, Namibe e Huambo); Congo (Brazaville e Ponta Negra); Gabão (Libreville); Camarões (Yaoundé e Douala); Índia (Jaipur, Nova Delhi e Bopal); China (Shangai); Coreia Do Sul (Yeotsu); Portugal (Lisboa, Santarém, Paredes de Coura, Viana do Castelo, Porto e Bragança); Espanha (Sevilha) Polónia (Cracóvia) e Cuba (Havana).

Quantos alunos e professores tem actualmente a Companhia?

Tratando-se de uma companhia profissional, a CDC Angola não tem alunos, mas sim bailarinos, que são sete. Quanto aos professores, tem uma permanente – Ana Clara Marques – e, ocasionalmente, tem tido a presença pontual de professores que se mostram disponíveis para colaborar.
A intenção de abrirmos uma oficina de Artes é, justamente, para que se possa fazer a partilha das distintas linguagens artísticas com alunos das mais diversas faixas etárias, bem como para ter um núcleo/viveiro de futuros bailarinos.

Quanto tempo demora a preparar um espectáculo?

Tudo depende das características de cada espectáculo, bem como dos meios e pessoas envolvidas. Em Angola, nunca demoramos menos de seis meses a preparar uma peça original. Claro que em outras partes do mundo é possível levar à cena um espectáculo com dois ou três meses de preparação, mas estamos a falar numa realidade com um meio profissional normal, como bailarinos formados e disponíveis oito ou mais horas por dia, salas de ensaio disponíveis, criativos e técnicos nas áreas da luz e som, teatros bem equipados a funcionar com equipas profissionais disponíveis, etc..

Fica dispendioso a criação de um novo espectáculo?

Sim, em Angola fica muito dispendioso. As pessoas não imaginam quanto! Os próprios patrocinadores não imaginam quanto pode custar uma produção do nível dos espectáculos da CDC Angola ou qualquer colectivo verdadeiramente profissional. Se considerarmos que, em Angola, é necessário pagar-se o aluguer do teatro que, por não estar equipado nos obriga ao aluguer de aparelhagem de luzes (mesa, projectores, traves e postes), de som (mesa, colunas), de vídeo, de gerador… e estamos a falar de somas exorbitantes, de preços altamente inflacionados, pois aqui tudo é negócio, gerador de lucro. Para além disto há que ter em conta os preços elevados que os técnicos cobram em Angola. Tendo em conta que as temporadas da CDC Angola têm, geralmente, a duração de 12 espectáculos, pode-se imaginar que o investimento na produção nunca é recuperado pelas receitas de bilheteira, apesar das salas encherem. Mas o nosso interesse é que as pessoas vão e recusamo-nos a vender bilhetes a 100, 200 e mais centenas de dólares. Os nossos bilhetes custam sempre entre 2.000 e 2.500 kwanzas, que é um valor inferior ao custo de uma refeição num restaurante barato em Luanda!

Como analisa o actual estado da dança em Angola?

Pobre, medíocre e preocupante. Existe uma gritante falta de profissionais, verifica-se a ausência de um discurso sério, conhecedor e estruturado sobre o que é a dança em todas as suas abrangências. A inexistência de ensino profissional especializado conduziu-nos ao excesso de curiosos que são, impunemente, mediatizados como experts dando a uma sociedade não muito informada a ideia distorcida do que é a dança na sua vertente de área de criação e de saber académico. No plano das danças patrimoniais assiste-se à extinção de alguns géneros, à “folclorização” (politização e descontextualização) de outros e à preocupante adulteração deste acervo, sobretudo a nível de grupos urbanos que as utilizam desvirtuando-as e esvaziando-as da sua essência.
A correcção desta situação só será efectuada com a implementação do processo de criação de um sistema de ensino artístico oficial em curso, o qual, pelas características deste tipo de formação profissionalizante, só dará frutos a médio e a longo prazo. Nesta altura, esperamos que a qualidade anule a vulgaridade que caracteriza a actual cena da dança em Angola onde, para já, está praticamente entregue à recriação.


No País existem espaços adequados à apresentação de espectáculos profissionais como os da CDC Angola?

Não! Em Luanda temos actualmente um único teatro. E, embora nem balneários tenha (nunca teve), é uma jóia patrimonial, mas já não acompanha as exigências das novas produções cénicas. Depois há outros espaços que as pessoas acham que são teatros, mas não são, pois para além de não possuírem as características próprias nem as proporções obrigatórias que requer um teatro, não possuem recursos técnicos para que sejam aceites como tal. Basta olhar para os palcos feitos em cimento! Nas províncias, o cenário é ainda mais desolador. Mas sei que uma equipa competente está a recuperar um Cine-Teatro em Malange. Ainda bem!...

Que qualidades deve ter um bom bailarino?

Deve ser formado em dança (preferivelmente com uma formação convencional de oito anos), deve gostar do que faz, deve estar sempre disponível para aprender, deve ser humilde e muito trabalhador. Deve, também, estar sempre actualizado e ter uma mente aberta e disponível para outras experiências, outras propostas estéticas, devendo estar sempre atento ao que se faz em todo o mundo. A aula de técnica deve ser a sua “refeição” mais importante do dia.

Em Angola existem muitos bailarinos profissionais?

Se tivermos em conta o acima referido, a resposta só pode ser “Não”. Acredito que o principal motivo está na ausência de um sistema de ensino artístico que se possa ocupar da formação profissional em dança. Embora as Escolas de Artes tenham sido abertas logo após a independência de Angola (ainda em 1976), a verdade é que nunca lhes foi dada a devida importância. Os resultados estão à vista. Um cenário pobre (falta de bailarinos e coreógrafos) e insidioso, em que um grande número de pessoas se dizem bailarinos e coreógrafos, sem terem a mínima noção do que fazem.

A CDC trouxe a Dança Inclusiva para Angola. Em que consiste o projecto e como foi aceite pelo público?

Como se sabe a Dança Inclusiva consiste na inclusão de pessoas portadoras de deficiências na dança. Pode ter início a nível da integração social e da terapia, mas a verdade é que existem hoje, um pouco por todo o mundo, toda uma série de companhias de dança inclusiva onde todos os bailarinos possuem estatuto profissional. Existem técnicas adaptadas a cada corpo e deu-se a conquista de outros corpos serem permitidos num mundo que sempre foi muito exclusivo, justamente, porque outros corpos não se adaptavam às técnicas existentes, particularmente às de clássico e de moderno.
Em Angola onde a guerra e a poliomielite produziram tantas pessoas com deficiências, e onde a sociedade ainda é tão cruel para com estas pessoas que são, permanentemente, vítimas de chacota e de exclusão, esta iniciativa causou grande surpresa e provou que um corpo diferente não é um corpo inútil. Quando, pela primeira vez, apresentámos o nosso bailarino Samuel Curti, houve até quem achasse que ele estava a representar um papel de pessoa com deficiência; não porque se tentava “disfarçar” a sua condição, mas porque ele se apresentou com grande mobilidade, autonomia, qualidade artística e capacidades técnicas.

Com que apoios contam para desenvolver o trabalho da CDC Angola?

Infelizmente a CDC Angola não possui grande apoio para o desenvolvimento de um trabalho que é único no País. E é revoltante pois apoiam-se generosamente e tantas vezes, iniciativas sem qualquer qualidade ou interesse e que nada acrescentam à cena cultural e social de Angola. Infelizmente há muito pouca sensibilidade para este trabalho, pois grande parte das pessoas desconhecem a sua verdadeira essência e os princípios em que se assenta. A nossa sociedade não possui uma educação artística especial e a dança é recreativa. Nunca foi feita esta sensibilização. Não existe arte nas escolas e as televisões, os agentes culturais e os promotores culturais não investem especialmente na dança enquanto actividade intelectual e séria.
No entanto, a CDC Angola tem alguns amigos fiéis que nos respeitam e que sempre acompanharam e conhecem o nosso trabalho. Esses são parte fundamental do nosso suporte para os espectáculos. Não nos dão dinheiro, mas apoiam-nos com serviços que são para nós de extrema importância. No entanto há gastos. Por exemplo, os bailarinos devem ser pagos mensalmente pois possuem exclusividade laboral com a CDC. Portanto, à semelhança do que se passa com as maiores companhias de dança mundiais, a CDC Angola tem de beneficiar de um regime de mecenato ou patronato fixos. Os patrocínios apenas resolvem problemas pontuais. Há que investir na arte de qualidade para que se colham frutos que beneficiem toda a sociedade e engrandeçam o País. Nem sempre o lucro deve ser de carácter financeiro pois, e passe o lugar-comum, “nem só de pão vive o Homem”.

Que apoio recebe a companhia por parte do Ministério da Cultura angolano?

Do Ministério da Cultura a CDC Angola tem o respeito, o reconhecimento e o apoio institucional, o que é importante, tendo este ano sido contemplada com uma verba do Fundo de Apoio a Projectos Culturais.

“Paisagens Propícias” é o mais recente espectáculo do grupo com coreografia de Rui Lopes Graça. Como surgiu esta parceria com o coreógrafo luso?

A CDC Angola havia decidido convidar um coreógrafo estrangeiro para a criação de uma peça. Esta prática é recorrente em qualquer companhia de dança mundial, pois as artes não podem estar fechadas a uma única linguagem ou proposta estética. O Rui Lopes Graça havia contactado connosco mostrando o seu interesse em colaborar. Assim que surgiu a possibilidade fizemos-lhe o convite oficial.

Como foi trabalhar com Rui Lopes Graça?

Foi um processo interessante e muito gratificante para os bailarinos. O Rui vinha já de uma experiência em África (Moçambique) e é uma pessoa que se adaptou bem às nossas realidades. É um coreógrafo sério e conseguiu, através do estudo e da pesquisa, penetrar na essência do tema que lhe propusemos.

Em que consiste o espectáculo?

O espectáculo vem a ser uma homenagem ao antropólogo angolano Ruy Duarte através das histórias e vivências dos pastores do sul de Angola (deserto do Namibe), ao mesmo tempo que é uma homenagem a estes povos através da vasta obra do Ruy Duarte, desde filmes, literatura, artes plásticas e fotografia.

A sua estreia decorreu em Portugal. Já foi apresentado em Angola?

Não, porque, dois dias antes da estreia, foi-nos anunciado que o Teatro seria encerrado por correr riscos de ruina, no seguimento de uma chuva torrencial que agravou uma fissura há muito existente numa das suas principais paredes. Até este momento, não começaram ainda as obras de reparação.

Em que países já apresentaram o espectáculo?

O espectáculo foi apresentado em Portugal (Lisboa, Porto e Bragança) e em Cuba (Havana).

Que outras datas e locais têm já agendados?

Está já programada a nossa presença no International Spring Festival em Israel e estamos a tentar ajustar datas para a nossa presença numa conferência sobre culturas afro-ibero-americanas na Polónia. É nossa vontade participar no Festival de Dança Contemporânea Kinane, em Moçambique, mas há que achar recursos.

Para quando está previsto a apresentação de um novo espectáculo? Já está a ser delineado?

Gostaríamos de estrear a nova peça até ao fim de 2013. Foram já dados alguns passos nesse sentido.

Que recepção tem tido o trabalho da CDC Angola além-fronteiras?

É um trabalho sempre muito bem recebido e apreciado. Os aplausos, as críticas na imprensa e os comentários do público podem comprová-lo.

Que iniciativas têm previstas para assinalar o Dia Mundial da Dança em Abril?

Infelizmente a CDC Angola funciona com uma equipa mínima, não se podendo dar ao luxo de grandes produções constantes. Para além do nosso habitual comunicado de imprensa, faremos uma sessão informal, como todos os anos, mas que tem sempre uma boa adesão do público que acorre em grande número.

Quais os projectos da Companhia para o futuro?

Que projectos e que futuro pode ter um colectivo de 20 anos que nem sede para trabalhar tem? Manter-se vivo, na mesma humilhante situação de tentativa de sobrevivência. E dançando… um dia de cada vez, sempre na beira do precipício, num desafio e luta permanentes pela dignidade e inovação com qualidade da dança em Angola.

Como surgiu a paixão de Ana Clara Marques pela dança? Que idade tinha?

Acho que nunca tive nenhuma paixão especial pela dança. Comecei com oito anos de idade numa Academia de Bailado em Luanda, que funcionava com o reconhecimento da Royal Academy of Dance de Inglaterra, cujas examinadoras eram assustadoras. Era muito criança e fui com as minhas amigas.

Fale-nos um pouco do seu percurso na dança até chegar à fundação da CDC Angola.

Frequentei essa Academia até Angola se tornar independente, tendo interrompido por força do seu encerramento. Retomei em 1976 como aluna, já numa escola do estado, mas em 1978 fui “atirada” para o lugar de professora e Directora da Escola de Dança da então Secretaria de Estado da Cultura, já que as professoras haviam partido. Era uma miúda. Aí surge um espírito de missão alimentado de sonhos (traídos), da obrigação de contribuir, com o que sabia e como podia, para a reconstrução e desenvolvimento de uma “Angola Nova”. Uma vez à frente da escola, abdiquei da tímida ideia, que entretanto formara, de vir a ser bailarina. A escola era um sacerdócio e se eu saísse ela fechava, como aconteceu, anos mais tarde. Dei à revolução (prejudiquei) o curso normal da minha carreira como bailarina, mas fiz-me coreógrafa. Licenciei-me, voltei para Angola, reabri a escola e fundei a CDC Angola que também paralisou (quem quer assumir e ter trabalho com um projecto não rentável em Angola?) quando voltei a sair para concluir o meu mestrado. Em 2008 retomei o antigo projecto e aqui estou, cheia de uma vida dedicada à dança e sem meios para trabalhar.

Ao longo dos anos tem publicado alguns livros. Em que consistem?

São contribuições para a história da dança teatral em Angola. São produto da minha prática universitária e também um testemunho e uma prova na primeira pessoa de um trabalho profissional iniciado e desenvolvido por mim, o qual, se nos distraímos, acaba por aparecer no curriculum de outrem (tentativas já aconteceram!).

Dedica-se à pesquisa e investigação das danças tradicionais angolanas. Como está a correr este trabalho?

É um trabalho demorado e lento. Trabalho no Ministério da Cultura e dirijo (assumindo, igualmente o trabalho de preparação técnica dos bailarinos) a CDC Angola. Tenho apenas duas pernas, dois braços e uma só cabeça. Não me chega! Pouco tempo me resta já para criar. A investigação está sempre presente, mas é, também, a que espera sempre; porque, essa sim, é uma paixão.





É assessora do Gabinete da Ministra da Cultura de Angola e membro individual do Conselho Internacional de Dança da UNESCO. Que funções desempenha nestes cargos?

Sou assessora da Ministra da Cultura desempenhando as funções que cabem a qualquer assessor, dando pareceres quando me são solicitados e participando activamente nos conselhos e nos projectos do Ministério, particularmente naqueles que se situam nos domínios do ensino, dos museus e das artes.
Quanto ao CID da UNESCO, estou à espera de maior disponibilidade de tempo para aceitar o convite para ser a representante desta organização em Angola.

Ana Clara Marques é uma das maiores referências da dança angolana. O que representa para si a dança?

A Dança é um mundo que tem diversas geografias, das quais só podem fruir aqueles que possuem sensibilidade, mente aberta, conhecimento sobre esse grande domínio, formação especializada e todos os que tenham a humildade e a nobreza de querer conhecer.

De que forma é que a dança transformou a sua vida?

A Dança tornou-me uma pessoa sem a oportunidade de, todas as semanas, ir aos saldos em Roma ou ao cabeleireiro em Paris e que me negou a possibilidade de ser “uma empresária de sucesso” e andar de jipe com motorista às ordens. Todavia, fez de mim uma pessoa de ideais incorruptíveis, resistente, corajosa e maior pois, para além das capacidades intelectuais e físicas que qualquer ser humano possui, descobriu-me entre aqueles que possuem um mundo próprio onde vive a inspiração e a capacidade de criar histórias em forma de movimento, para o encantamento e alimento da alma.



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