domingo, 31 de outubro de 2010

Ágora (140) - Cabeças coroadas?



Muitas vezes escrevemos algumas das nossas crónicas numa pressinha! O resultado tem um denominador comum: É penoso para quem escreve e fundamentalmente para quem lê.


Quero pedir-vos desculpa pelo conjunto de vulgaridades desta crónica, mas a realidade é que estou sem um estímulo forte, que me permita escrever a parecer razoavelmente bem.

Ouvi recentemente uma conversa entre umas senhoras, já a caminharem para provecta idade, e que para as festas em Luanda nos anos sessenta, levavam as cabeleiras coreanas louras que o falecido Horácio Roque vendia, a lembrarem-se das “mises “ que faziam na “Ana Bolena”, para tentar resplandecer nas festas do Clube dos Caçadores e do Clube Naval, locais eleitos pela burguesia colonial para as suas noites mais badaladas.

A “Ana Bolena” era o salão de cabeleireiro mais afamado da cidade, perto do que é hoje o prédio da BP, e era uma autentica escola de cabeleireiros, já que quase todas as muito aperfeiçoadas profissionais que montavam salão desde a Cuca ao Catambor, referenciavam essa escola, a que não eram alheios os olhares libidinosamente encervejados do androceu“Amazonas”, do outro lado da avenida dos Restauradores, hoje Rainha Jinga!

Faz-me alguma confusão, um salão de cabeleireiro homenagear uma rainha de Inglaterra, que morreu decapitada na Torre de Londres. Eu acho uma situação no mínimo hilariante, como acharia dar o nome de Yull Brinner a uma barbearia. Ana Bolena era uma nobre francesa por quem Henrique VIII se apaixonou, exigiu que o Papa anulasse o seu casamento com Catarina de Aragão, e como o Papa Clemente VII excomungou o Rei, este resolveu fundar a Igreja Anglicana, e torná-la religião de estado, algo que ainda acontece hoje em Inglaterra, em que a rainha é a entidade máxima da Igreja. Para que conste foi mãe de Isabel I de Inglaterra (1533).

“Ana Bolena”, o cabeleireiro, destronou em fama o “Salão Império”, situado num primeiro andar ao lado do Hotel Avenida, que por sua vez está localizado numa rua (!!!) com o máximo de cem metros, ali para os lados do antigo Palácio do Comércio, hoje MIREX. Olhando a história, penso que esta alteração, foi premonitória sobre o futuro do que veio a acontecer em Angola: A cabeça do império acabou decepada!

Havia ao tempo uns malandros da vela, modalidade muito querida pela “BUFA” (designação “reviralhista” da Mocidade Portuguesa, que iam esperar as meninas da “Ana Bolena”, vogando à bolina.

Porque estamos em momentos de generalidades, hoje peguei num esquecido pacote de “Ouro Preto”, um tabaco de cachimbo que a FTU produziu, e que fumei até me assaltarem a casa e me terem roubado uma pequenina, mas preciosa colecção de cachimbos. Era um tabaco notável, e se estivesse muito seco, carregávamos-lhe com um bocado de whisky, e em nada era pior que o Mayflower, o Balkan Sobranie, Amphora, ou outros picados para cachimbo. Embora tenha deixado de fumar, não esqueço aquele aroma de um tempo em que nos primeiros tempos da independência, só alguns saboreávamos mesmo esse néctar.

Foi um “Ouro Preto” que nunca trouxe muitas contas e interesses acrescidos ao País. Fumá-lo, vendo bem algumas coisas até foi uma coisa boa!

Fernando Pereira

31-8-2010


Pensar e Falar Angola

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